segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

IMPRESSÕES DIGITAIS


Meu conto “Caro Poeta Arnaldo Antunes” foi menção honrosa no Concurso de contos Newton Sampaio, da secretaria de cultura do Paraná e vai fazer parte da antologia que será publicada em 2010. Segundo me informou a secretaria, estavam na comissão julgadora do prêmio Marina Colasanti, Miguel Sanches Neto e Flor de Maria Silva Duarte. E eles analisaram 2111 contos. E agora em primeira mão para vocês...

CARO POETA ARNALDO ANTUNES,


Eu resisti muito antes de te escrever essa carta. Juro que resisti. Mas não teve jeito. Eu preciso da tua ajuda. Pelo amor de Deus, Arnaldo, me ajuda.
Mas eu falando assim você até se assusta, pensa que eu sou um louco, é capaz de jogar essa carta fora na primeira lata de lixo. Não faça isso, por favor. Me dá uma chance de explicar tudo, tintim por tintim.
Bom, eu sou casado. E é daí que vem a história toda, do meu casamento. Porque tem a minha mulher, mas eu acho que é melhor eu te contar uma outra coisa primeiro, antes do meu casamento. Se bem que você já sabe que eu sou casado. Isso é bom. Isso faz parte do meu problema e da ajuda que eu vou te pedir. Mas antes eu tenho que contar o problema que eu tenho com você.
Arnaldo, eu roubei um poema teu. Eu sei que a essa altura você está puto comigo, desculpe o puto, eu quis dizer muito aborrecido, mas me dá uma chance porque estou desesperado. Desesperado mesmo. Eu acho que é um caso de vida ou morte. Mas calma, não é vida ou morte sua nem da minha mulher que eu não sou assassino nem nada. É vida ou morte minha mesmo. Por isso eu te peço, continua lendo, Arnaldo.
Eu nunca roubei nada na minha vida. Uma vez uns amigos pegaram a chave da casa de um sujeito mas eu juro que nem entrei lá. Quer dizer, entrei mas não mexi em nada e saí logo. Nós éramos uma turma de crianças, eu, o Caveira, o Bicudo e o Marcelo, e tudo era farra. Roubar mesmo? Nunca! Se roubei um poema teu foi por paixão. Não é por você não, que eu não sou viado nem nada dessas coisas. Também não tenho nada contra não, cada um sabe de si, não é mesmo? Eu explico a minha paixão, Arnaldo, continua aí que eu explico.
Eu tô casado com a Adélia há 3 anos. Eu te contei que a minha mulher se chama Adélia? Bom, eu li tudo que escrevi antes, vi que não tinha contado que ela se chama Adélia, então agora tá contado.
Mas antes da gente casar, eu já conhecia a Adélia. A gente sempre morou na mesma rua e sempre teve um grupo de amigos, desde pequeno e desde pequeno que eu sou apaixonado por ela, desde os cinco anos de idade, pelo menos.
Você teve alguma menina assim, que você foi apaixonado um tempão? Deve ter tido, não é? Eu acho isso super normal. Aliás, eu queria te falar que não foi só um poema que eu peguei. A verdade é que foram vários, sabe, Arnaldo? Eu precisava te dizer logo isso. Mas não perde a paciência comigo, continua lendo aí, por favor.
Eu tava falando de paixão, não é? Da minha paixão desde os cinco anos. É normal. Os meus pais é que tinham essa mania de dizer que isso era maluquice minha, que eu não regulava bem da bola, mas eu não ligava, nunca liguei nem ligo agora, agora que eu e Adélia estamos casados e que eles, meus pais, continuam dizendo que é uma maluquice minha. Eu não ouço mas sei que eles continuam dizendo. Os meus pais são complicados, Arnaldo. Mas deixa isso pra lá. Você deve estar se perguntando onde é que entram os seus poemas nessa história toda. Você pode até estar achando essa história meio maluca, não tá não? Tudo bem, Arnaldo, essa história é meio maluca mesmo.
Eu acho que quando a gente conta as histórias lá de dentro da gente, todas elas são meio malucas. Mas são importantes, Arnaldo. Como os seus poemas. Eles também são meio malucos, não é não? Mas também são importantes. Devem até ser importantes na história da literatura do Brasil, eu acho, não tenho certeza que eu não tenho tanto conhecimento assim. Agora, com certeza são importantíssimos na minha história, Arnaldo. Sabe por quê?
Bom, o problema é que antes de eu e a Adélia sermos casados, antes mesmo da gente namorar, eu já queria namorar com ela, mas não era só eu. É. Tinha um outro cara da rua, o Osório, que também queria namorar a Adélia. Agora, o que você não sabe é que o Osório era considerado o cara mais bonito da rua. E o que você também não sabe é que a Adélia era doida por doce. Era não, ainda é. Mas e daí?, você deve estar se perguntando.
Pois eu respondo. Antes eu queria te dizer que a verdade mesmo é que eu roubei muitos poemas seus, Arnaldo. Mas eu não tive escolha, você vai ver e vai até me dar razão, mesmo ficando puto comigo. Desculpe o puto de novo, mas é só você se segurar aí que eu explico, tá?
Bom, eu tava falando que você devia estar se perguntando. Lá dos doces da Adélia, lembra que eu falei, quer dizer, que eu escrevi mas e daí? E daí que o pai do Osório, o seu Osório, é o dono da melhor loja de doces do bairro.
É um bairro pobre, o nosso. A gente diz que é classe média baixa, mas os outros chamam a gente de pobre mesmo e, dependendo da hora, até de favelado. Bom, você veja então as vantagens que o Osório tinha pra conseguir namorar a Adélia. O mais bonito, o mais paquerado pelas meninas e com todos os doces do mundo pra dar pra qualquer uma delas, principalmente pra Adélia, que ele já tava de olho e que ela adorava doce.
Eu também tentava agradar a Adélia. Sempre juntava dinheiro pra comprar flor pra ela. Até que um dia descobri que ela tinha alergia e não podia ter flor em casa. Ela sempre jogava fora as flores que eu comprava. Você veja que azar, Arnaldo!
Além disso, eu pedia ajuda aos meus pais. Mas eles só diziam para eu parar com essa mania, se a família dela descobrisse eu ainda acabava preso como tarado, louco, essas coisas, e meu pai ainda gritava vai é trabalhar, seu vagabundo. Bem alto, pra vizinhança toda escutar. E eu ainda não te falei, mas a Adélia e a família dela eram nossos vizinhos. O meu pai é muito complicado, sabe, Arnaldo. Mas deixa isso pra lá.
Daí teve o baile que a gente foi, no clube lá perto de casa. Tocou Titãs a noite toda. Disseram até que vocês iam aparecer, mas vocês não apareceram não. Deve ter sido mentira do pessoal. Todo mundo aqui no bairro mente muito, Arnaldo. Parece uma epidemia. E o engraçado é que as mentiras são sempre pra aumentar as coisas. Eu acho que a turma aqui é meio complexada pela pobreza, daí tentam esconder, mas isso já é outro assunto.
Bom, onde eu estava? Ah, já vi, no baile. A Adélia dançou comigo e com o Osório também. O problema é que o Osório dançava muito melhor que eu. Eu acho que é por causa da minha perna, eu tive um desastre de bonde quando eu tinha sete anos, sabe? E fiquei com esse problema. Mas isso não vem ao caso.
Problema mesmo era o Osório sempre melhor que eu. Foi quando eu tive a idéia de escrever uma carta pra Adélia, contando todo o meu problema, quer dizer, problema não, contando todo o meu amor por ela. O problema era não ter o amor dela por mim, mas eu não podia escrever uma carta de amor reclamando e exigindo o amor dela, não é não? Foi o que eu pensei depois de escrever umas vinte cartas.
Eu menti. Não foram umas vinte cartas. Foram mais de cem. E nenhuma prestava, Arnaldo, te juro que nenhuma prestava. Me deu um desespero. Eu não fazia outra coisa a não ser escrever carta, dia e noite e não adiantava nada, eu ia perder a mulher da minha vida. Sabe lá o que é isso? Ainda por cima com seu pai e sua mãe em cima, dizendo que você tá doido de vez, não tem mais saída? Sabe como que isso dói dentro de um sujeito?
Mas eu conto, conto e não te conto, não é, Arnaldo? Tá vendo como eu não sei escrever?
Bom, eu não sei escrever mas eu gosto de ler. Eu leio sempre. E eu gosto de ler poesia, sabe? Meus pais, pra variar, são contra, perda de tempo!, esquisitice! É o que eles sempre gritaram. Eles gritam muito, sabe? Mas eu gosto. Quer dizer, não gosto dos gritos, gosto de poesia. Foi uma professora que lia pra gente em sala, em vez de dar aula. Muito boa essa idéia dela, porque aquelas rimas, aqueles sons, aquilo tudo entrou na minha cabeça e nunca mais saiu e nunca teve nada melhor que entrasse na minha cabeça e se eu pudesse eu seria mesmo é poeta, eu daria tudo para ser poeta, tudo. Menos o amor de Adélia, é claro. Aliás o caso aqui foi bem ao contrário. Eu dei o poeta em troca do amor dela.
E o poeta era você, Arnaldo. Foi, sim. No desespero, eu tive uma idéia. Eu tinha uns livros teus, o Palavra Desordem, o As Coisas e mais uns. Na verdade eu acho que tenho todos os seus livros. Você podia autografar eles pra mim. Mas isso já é outra conversa. Você vê, numa carta dessas eu tenho a maior dificuldade de manter o fio da meada e ir no assunto certo, como é que eu ia ser poeta? Se bem que poeta não mantém muito o fio. Mas olha eu indo embora de novo.
Bom, eu peguei teus textos, copiei com a minha letra e comecei a mandar pra Adélia, como se fossem poemas meus pra ela. Foi isso que eu fiz.
Fiz mal? Fiz, é verdade, os poemas são teus, você que queimou a mufa criando aquilo tudo. Mas o que a gente não faz por amor? Tudo, tudo, tudo! Eu já falei, não é? Quer dizer, crime eu também já falei que não faço, mas o resto? Qualquer coisa, Arnaldo! Bom, viadagem também não, mas eu já falei disso. Daí que eu fiz essa loucura.
E deu certo, ela ficou doida por mim! O sonho dela era namorar um poeta. Ou passou a ser. E eu nem sabia disso! Tava escrito, não tava não? Eu gosto dessa mulher desde os cinco anos! E acertei na mosca, Arnaldo! Ela me escolheu! Ela não quis mais nada com o Osório!
Olha só, adivinha qual foi o primeiro poema teu que eu mandei? Pensou aí? Vê se você acertou, foi aquele que começa assim ó: estamos sob o mesmo teto / secreto / (tem que botar esse tracinho quando escreve verso seguido assim, não tem, Arnaldo?) onde o sol indesejável é barrado / eu e você / sob o mesmo nós / dois, sóis / sob o mesmo pôr / (o enigma do amor).
Esse enigma do amor ela vive repetindo até hoje. E ela nem sabia o que que queria dizer enigma. O pior é que ela me perguntou e eu também não sabia. Daí eu embromei, é uma coisa, assim, misteriosa, eu chutei. E não é que era mesmo, que depois eu olhei no dicionário?
Daí eu segui mandando os teus poemas. Caramba, não dava pra parar, Arnaldo. o seu / olhar melhora / o meu. Eu ainda imitava o jeito que você fazia pra botar o poema na página. Você é craque nisso, hein? Isso é que é o tal do poema visual, não é? E te digo mais, tinha uns poemas que dava pra dividir em três ou quatro partes, viravam três ou quatro poemas, porque eram grandes e eu aproveitava.
Tem aquele, porque eu te olhava e você era o meu cinema, a minha Scarlet O’Hara, a minha Excalibur, a minha Salambô, a minha Nastassia Filípovna, a minha Brigite Bardot... e vai por aí afora. Esse eu dividi em várias partes. Tinha umas mulheres que eu nunca ouvi falar, daí eu inventei que elas eram estrelas de cinema ou heroínas, sei lá, da revolução russa e da francesa, que eram as revoluções que eu lembrava.
E aí eu tenho que te contar mais uma coisa chata. Que começou nesse poema aí. É que eu me empolguei e chegou uma hora em que ele ia acabar. Daí eu comecei a inventar eu mesmo mais um monte de nomes pro poema render mais. Eu não fiz por mal, nem por falta de respeito, Arnaldo. É que aquilo tudo era um sucesso. Eu tinha conseguido o que mais queria na vida, o amor de Adélia. Eu tinha descoberto que o sucesso é a felicidade, Arnaldo.
E eu fui: porque eu te olhava e você era a minha praia, a minha miss Suéter, o meu éter, o meu halteres, o meu conhaque, a minha Rita Cadillac... E por aí afora. Eu virei teu parceiro.
Desculpa. Eu não sei te explicar, quer dizer, eu expliquei o que eu consigo. Como eu te falei, o meu amor por Adélia. E como você falou, nem todas as respostas cabem num adulto.
Mas o que aconteceu foi que eu e Adélia viramos namorados, viramos noivos e viramos marido e mulher. Mesmo com os meus pais dando contra. Você acredita que eles não foram no meu casamento? E quando eu perguntei o que que a Adélia tinha de errado pra entrar na nossa família, sabe o que eles me disseram? Que o que estava errado era eu entrar na família dela.
Bom, eu cortei relações com os meus pais. E eu e Adélia fomos morar numa casa quase na esquina da nossa rua. Daí foi tudo bem, sabe? A gente se ama, nossa vida de casado é ótima, a gente nunca briga, a gente trabalha pra caramba e agora a Adélia tá grávida. Cinco meses. Até minha mãe apareceu por aqui, quer dizer, rondando aqui pela porta da casa, de olho comprido.
Você não deve estar entendendo. Se tá tudo essa maravilha pra que que esse idiota tá me escrevendo pra dizer que roubou meus poemas? Pra eu ir na delegacia e botar ele na cadeia? Você deve estar se perguntando bem assim, não é? Mas eu te peço pra não dar queixa de mim não, nem me botar na cadeia. E eu explico. Vem tragédia aí, Arnaldo, te prepara porque vem tragédia.
É por isso que eu te escrevo. Quer dizer, por causa da tragédia que eu vou contar agora. Arnaldo, você já pensou em fazer um poema sobre a Confeitaria Colombo? É que lá do lado do meu trabalho tinha uma Confeitaria Colombo linda. Mas agora eles fecharam a confeitaria e abriram uma agência de automóveis no lugar. Você acha isso certo? Isso não dá um poema?
Mas agora eu não quero falar de poesia. Depois a gente conversa disso. O negócio foi o seguinte. Um dia eu chego em casa e a Adélia tava com um livro seu numa mão e todas as minhas cartas-poemas na outra. E o livro era logo o Palavra Desordem, que eu tinha feito um monte de cartazes com umas letras iguais as que você pôs. E eu pegava as tuas palavras desordem, não é isso?, não é esse o nome?, e ia juntando umas com as outras, inventando umas continuações, fazendo o diabo, viu, Arnaldo? Me desculpe, aliás, não é?
Mas o negócio é que a Adélia descobriu que os meus poemas não eram meus. Agora, como? Os teus livros, eu deixo no trabalho, exatamente pra que nunca tivesse o risco dela pegar por acaso, tirando o pó, porque ela não gosta de ler. E isso me dava certeza que eu nunca ia ser pego.
Mas agora é isso. O meu casamento está, como se diz?, em cheque, lascado, em crise, desculpe o termo mas fudido mesmo, porque a Adélia descobriu que o poeta por quem ela se apaixonou nunca existiu. Era só um ladrão de versos. E não adianta eu falar de tudo que a gente construiu, da nossa felicidade, da nossa filha que vem aí (é uma menina!), e sei lá eu mais do quê, já me virei a falar de tudo, até um outro poema teu eu pensei em usar mas depois achei melhor não.
Ela quer ir embora, Arnaldo, levando nossa filha e levando a ela própria, que é tudo que eu tenho na minha vida, que nem é lá essas coisas, mas que ficou tão boa, tão maravilhosa desde que a gente está junto.
Eu vou te falar com sinceridade, eu não queria nenhuma outra vida, eu não trocava a minha nem pra ser rico, milionário, político, jogador de futebol, artista de novela. No duro, eu não queria ser nem o poeta Arnaldo Antunes que eu admiro tanto, viu?
É, eu sei que é esquisito o que eu falei aí em cima. Se eu não queria ser você por que que roubei teus poemas, né? Desculpe.
Mas eu preciso te contar a verdade. Eu não tô te escrevendo pra pedir desculpa. Não. Pelo menos não só por isso. Eu te peço desculpas, sim, mas eu tô te escrevendo principalmente porque eu preciso muito da tua ajuda. E eu nem sei o que que eu te peço. Acho que eu vou precisar pedir a tua ajuda até nisso, você vai ter que me ajudar a saber como você vai me ajudar, Arnaldo.
Eu sei que é confuso, eu nunca fui uma pessoa muito clara. As professoras sempre escreviam isso nas minhas provas, mas eu não consegui mudar. O máximo que eu consegui foi passar de ano até completar o segundo grau. Agora, como foi que a Adélia descobriu tudo isso, dos livros e tal? Pra mim, alguém me dedurou. Daí sabe o que eu pensei? Será que você escrevia uma carta pra ela, dizendo que eu sou seu parceiro mas nunca quis aparecer? O que que você acha disso, Arnaldo?
Se bem que uma outra carta tua ela pode achar que fui eu que fiz de novo. Desculpe, idéia não é o meu forte.
Ah, já sei! E se você desse um pulo aqui em casa e dissesse isso pra ela? Você podia vir bem de noite, quando a rua já estivesse vazia, o pessoal aqui dorme cedo que todo mundo também acorda cedo pra ir trabalhar. Assim ninguém te perturbava. Quem sabe eu trazia os teus livros que eu guardo no trabalho e você até autografava eles.
Mas essa idéia também não é boa. Vai te dar uma trabalheira danada. E logo com quem? Com um cara que roubou os seus poemas. Agora, isso continua martelando aqui dentro de mim, alguém contou essa história pra Adélia.
É bem capaz de ter sido coisa dos meus pais. Quando eu comecei a escrever os poemas, quer dizer, copiar teus poemas pra Adélia eu ainda morava com eles. E minha mãe sempre bisbilhotou minhas coisas. Ela pode muito bem ter encontrado e os dois guardaram esse troço, esse segredo, pra usar na melhor hora. E qual a melhor hora pra uns pais que detestam o filho que têm? Ora, quando a mulher dele está grávida, é ou não é? Que assim acaba o casamento e ainda afasta a filha do cara, olha só, não faz sentido? Faz sentido sim!
E se você dissesse pra ela que foi ao contrário? Que você que roubou os meus poemas? Mas espera aí, e se foi o sacana do Osório que descobriu tudo e contou pra Adélia? Como que ele descobriu eu não sei, mas pode ter sido, não pode?
Ou então você diz que você compra as coisas que eu escrevo. Faziam isso no samba, não é? Eu soube que o Moreira da Silva, o cara do samba de breque, comprou samba à beça. E mesmo assim todo mundo respeita ele, o Moreira morreu sendo considerado um grande cantor. E você também já é um grande cantor. Ninguém vai te desconsiderar por isso, não vai mesmo, eu garanto. Quer dizer, garantir mesmo, eu não posso não, Arnaldo.
Eu não sei mais o que dizer. Sei lá. Você quer ser amante da minha mulher? Ela é linda. E eu me conformo. Pra não perder Adélia, eu me conformo.
Eu não quis te ofender nem nada. É que eu estou perdido. Se você me ajudar, o que que eu posso te dar em troca? Te chamo pra padrinho da minha filha. Se bem que ser padrinho de filha de pobre não é homenagem, é trabalho, encrenca. Posso batizar ela de Arnalda, em tua consideração.
O que mais? Posso te prometer que nunca mais eu roubo os teus poemas, nunca mais. Isso já está prometido desde já. Mas eu continuo precisando da tua ajuda, Arnaldo. Por favor. Olha, “Parecem longe mas são pequenos. Parecem mortos mas estão quietos. Parecem terra mas estão vivos. Parecem letras nos livros.”, Arnaldo.

4 comentários:

  1. Antes de começar a ler eu escorreguei o dedo (sem querer) pela barra de rolagem e vi que o texto era enorme, mas não me contive e comecei a ler, e não me arrependo.

    Um texto longo, mas que prende o leitor, você quer saber o final!

    Me identifiquei com o personagem, eu bem que tento escrever poucas linhas, mas não consigo.rss

    Parabéns!!


    Um abraço

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  2. Oi, Margô,

    Que bom que voce gostou.
    Às vezes, mais difícil do que escrever é enxugar depois. E na arte eu acho que quase sempre menos é mais. Como disse um poeta, quanto menor mais do tamanho da China.

    Beijo

    Cesar

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  3. Pô, Cesinha, até que enfim li este texto, que eu abri umas 3 vezes, mas sempre junto com um montão de coisa, e nunca terminava.
    Maravilha! Mais uma vez, maravilha!
    Agora, pô, bem que o Arnaldo podia ir lá e quebrar esse galho...
    Se for, vc conta, tá?
    Abs,

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  4. Ok, Guina,

    Vamos ver se o meu personagem consegue convencer o poeta.

    Abração

    Cesar

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