sexta-feira, 29 de outubro de 2010

CAIU NA REDE É PIXEL






tantas e tão plurais as nossas fés
o improvável o etéreo o impalpável e sua tradução
no pescoço no vidro do carro no pulso
estampada no corpo tatuada na roupa pendurada num retrovisor
num pequeno altar no canto da casa numa prateleira de um botequim
no gesto de dar uma pro santo
andar com fé eu vou?

CHIPS – o prazer da batata & o poder do circuito –


Maninho Cesar,
Aí vai mais um haiconto de minha larva. Publique-se! (Ou limpe-se com o papel, o que você achar mais sensato e oportuno.)

Beijos nos córneos
Alice

O SENTIDO DA VIDA

1. Ele sabe que precisa se levantar. Mas sente muito, muito sono.
2. Ele vai se levantar, mas só em pensar que terá que enfrentar tudo de novo...
3. Ele pensa: pra quê? Pra quê? E continua deitado.
4. Ele quer que o cérebro lhe mande um comando: levantar! Mas o cérebro lhe manda uma frase estranha: “a vida não vale a pena e a dor de ser vivida”.
5. “Quem terá dito esse troço?”, ele pensa.
6. Em seguida ele sacode a cabeça, espantando o torpor e dizendo pra si mesmo: não adianta ficar com essa conversa mole. Tenho que levantar a-go-ra! Vamos lá.
7. Mas o resto do seu corpo grita: “ah, só mais um pouquinho!”
8. Em vez de reagir, ele ri. Ri muito.
9. Enquanto tenta conter o riso, ele pensa: “mas o que será que está acontecendo comigo dessa vez?”
10. Por fim ele diz: “ah, foda-se. Eu queria mesmo era ser sambista”, e afunda de vez a cabeça entre as luvas, enquanto o juiz ergue o braço do outro lutador e o estádio delira e urra.

“NÚNCARAS” – po+es+ia


ADRIANO ESPÍNOLA

A poesia solar do cearense Adriano Espínola se constrói com musicalidade e concisão,
fugindo do derramamento verbal. Em uma das vertentes criativas de seus versos,
o poeta dialoga com a história da literatura, revelando suas leituras e conversas
e mostrando como foi construindo seus caminhos.
Adriano publicou os livros Táxi/Metrô (1996), Beira-Sol (97), Fala, Favela (98),
O Lote Clandestino (2002) e praia provisória (2006,
Prêmio 2007 de poesia da Academia Brasileira de Letras).


CAIS

Ó nau, de novo, ao largo mar te levam / as ondas!
Horácio

à beira
do
velho
cais

ondas
novas
levam
ao
vento

o teu
barco
e este
mo
mento

para
o mar
do nunc
a
mais


O PREGO

o que mais dói
não é o retrato
na parede

mas o prego
ali cravado
persistente

no centro da
mancha
do quadro au-
sente


A CEBOLA

Cortá-la camada
por camada
até chegar

ao centro.

(Ao bulbo do nada
do eu
mais dentro.)

Não chorar.


SOUSÂNDRADE

yea!
na
lín
gua

por
tu
guesa
a

por
tou
er

rante
um
guesa


Língua-mar

A língua em que navego, marinheiro,
na proa das vogais e consoantes,
é a que me chega em ondas incessantes
à praia deste poema aventureiro.
É a língua portuguesa, a que primeiro
transpôs o abismo e as dores velejantes,
no mistério das águas mais distantes,
e que agora me banha por inteiro.
Língua de sol, espuma e maresia,
que a nau dos sonhadores-navegantes
atravessa a caminho dos instantes,
cruzando o Bojador de cada dia.
Ó língua-mar, viajando em todos nós.
No teu sal, singra errante a minha voz.

MERCADO FINANCEIRO - o melhor investimento para o seu dinheiro


Nesta semana o Mercado foi dormir nervoso e em vários dias acordou todo urinado. Parece que terá que usar fraldão geriátrico mesmo. Segundo os Índices Dow Jones e Bovespa os melhores papéis para investimentos no momento são AUGUSTO MONTERROSO ao portador e JORGE LUIS BORGES preferencial. Vejam alguns exemplos:


O VÉU DE PENÉLOPE, OU
QUEM ENGANA A QUEM

Faz muitos anos vivia na Grécia um homem chamado Ulisses (que apesar de ser bastante sábio era muito astuto), casado com Penélope, mulher bela e singularmente dotada cujo único defeito era sua exagerada mania de tecer, costume graças ao qual conseguia ficar sozinha longas temporadas.

Diz a lenda que em cada ocasião em que Ulisses com sua astúcia observava que apesar de suas proibições ela se dispunha a começar de novo um dos seus intermináveis tecidos, podia-se vê-lo às noites preparando às escondidas as suas botas e uma boa barca, até que sem dizer nada ia percorrer o mundo e em busca de si mesmo.

Dessa maneira ela conseguia mantê-lo afastado enquanto flertava com os seus pretendentes, fazendo-os acreditar que tecia enquanto Ulisses viajava e não que Ulisses viajava enquanto ela tecia, como pode ter acreditado Homero, que, como se sabe, às vezes dormia e não se apercebia de nada.

Fábula de Augusto Monterroso, em A Ovelha Negra e Outras Fábulas, da Editora Record, e que se encontra esgotado. Mas eu acabei de comprar um exemplar pesquisando nos sebos da internet. (Ei, dona Record, quando é que a senhora vai reeditar esse livro do Monterroso e aproveitar para lançar mais uns livros dele, hein? Hein? HEIN?)


O labirinto

Esse é o labirinto de Creta. Esse é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro. Esse é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja trama de pedra se perderam tantas gerações. Esse é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja trama de pedra se perderam tantas gerações assim como María Kodama e eu nos perdemos. Esse é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja trama de pedra se perderam tantas gerações assim como María Kodama e eu nos perdemos naquela manhã e continuamos perdidos no tempo, esse outro labirinto.

Texto de Jorge Luis Borges, em Atlas, seu novo livro, em parceria com María Kodama, recém-lançado pela Companhia das Letras e composto de textos e fotos, ou, como melhor explica Borges, “cada título abarca uma unidade feita de imagens e de palavras”. Corra até a livraria mais próxima de sua casa e compre logo! Anda! Depois você volta e continua a ler o PATAVINA’S.

SALTA UMA CAROS AMIGOS NA MESA 5!


Já está nas melhores bancas do ramo a nova edição da revista Caros Amigos. Além deste cronista que vos fala (e cuja a crônica vós podeis ler abaixo), a revista traz: entrevista com o jurista Fábio Konder Comparato, a perseguição ao Funk, a luta política na Venezuela, a destruição contínua do Iraque pelos EUA, as mulheres no Irã, as favelas incendiadas em Sampa e muito mais, sem falar no timaço de colunistas que todo mês dá um show de bola por lá. Vai já na banca comprar. Anda, seu preguiçoso! Depois você lê a minha crônica aí embaixo. Vai!

LEIA ESTA CRÔNICA E VENÇA NA VIDA!

Acabaram-se as eleições, estamos livres dos mentirosos do horário eleitoral e podemos voltar a mentir por conta própria e a qualquer hora. Eu já comecei lá no título da crônica. Você não vai vencer na vida lendo isso aqui nem fazendo coisa alguma. A vida termina sempre com uma derrota chamada morte. E ponto.

Só que essa afirmação também pode ser mentira. A mentira é só uma verdade que esqueceu de acontecer, mas ela vem sendo perseguida através dos tempos. Mentir é feio, é pecado, é anti-ético, é contra-revolucionário. Cada um tem seus motivos pra condenar a mentira e no entanto não fazemos outra coisa a não ser mentir. Acordar e dar bom dia a essa altura da humanidade é mais do que otimismo: é cascata pura. O planeta não tem recursos pra sustentar nosso consumo e a temperatura vai subir até derreter todos nós: bom dia por quê? Além disso, você está indo pra praia, pra um barzinho tomar caipirinhas, pra um cineminha e vai fechar o dia no motel? Ou vai deixar as crianças atrasadas na escola, se meter no metrô lotado e ir pro trabalho, aturar seu chefe? Bom dia? Você só pode estar de sacanagem!

Mas não se desespere: eu minto, tu mentes, ele mente. Eis a verdade nua e crua. Contar lorotas, potocas, patranhas, imposturas, enganos, fraudes ou falsidades já virou até profissão. Está aí a publicidade que não nos deixa mentir, porque mente primeiro e com muita verba. E nem Deus escapa: se Caim mentiu quando Ele perguntou onde estava o Abel, Deus mentiu primeiro, quando fingiu que não sabia. Ele não é onisciente e onipresente?

Então, vamos descriminalizar a mentira já! Afinal, diga a verdade: tem coisa melhor do que mentir?

OUTDOR - po+es+ia +v+is+ual



SUS
TENTA
A
SORTE
ENTRE
A
CORTE
E O
COR
TE

PORQUE ESCREVO

“Se fosse sólido eu comia. Se fosse líquido eu bebia. Escrevo porque é gasoso.”
Alice Barreira

Num conto delicioso de seu livro DINORÁ (Ed. Record) Dalton Trevisan se auto-esculhamba, usando os clichês com que a turma crítica a ele sempre o ataca. Ou então, quanto mais se auto-esculhamba mais se elogia e avacalha a moçada do contra. Decida você mesma!

QUEM TEM MEDO DE VAMPIRO?

Há que de anos escreve ele o mesmo conto? Com pequenas variações, sempre o único João e a sua bendita Maria. Peru bêbado que, no círculo de giz, repete sem arte nem graça os passinhos iguais. Falta-lhe imaginação até para mudar o nome dos personagens. Aqui o eterno João: “Conhece que está morta.” Ali a famosa Maria: “Você me paga, bandido.”

Quem leu um conto já viu todos. Se leu o primeiro pode antecipar o último – bem antes que o autor. É a sagrada família de barata leprosa com caspa na sobrancelha, rato piolhento na gravata de bolinha, corruíra nanica do dentinho de ouro. Trincando broinha de fubá mimoso e bebendo licor de ovo?

Mais de oitenta palavras não tem o seu pobre vocabulário. O ritmo da frase, tão monótona quanto o único tema, não é binário nem ternário, simplesmente primário. Reduzida ao sujeito sem objeto, carece até de predicado – todos os predicados.

Presume de erótico e repete situações da mais grosseira pornografia. No eterno sofá vermelho (de sangue?) a última virgem louca aos loucos beijos com o maior tarado de Curitiba. Explica-se: não foi ele fabricante de tradicionais vasos de barro? E seus contos, o que são? Miniaturas de bispote em série, com florinha e filete dourado.

Um mérito não se lhe pode negar: o da promoção delirante. Faz de tímido, não quer o rosto no jornal – e sempre o jornal a publicá-lo. Nunca deu entrevista e quanta já foi divulgada, com foto e tudo? Negar o retrato é uma secreta forma de vaidade, a outra face do cabotino.

Pretende, forte modéstia, ser o último dos contistas menores – e não é que tem razão? Aliás, nem contista. Nas frases mutiladas e estripadas, um simples cronista de fatos policiais. Nele não há outra postura ética e moral. Nem simpatia e amor pelo semelhante. Só e sempre os tipos superficiais de dramalhão, fantoches vazios, replicantes sem alma. Vítimas e carrascos no circo de crueldade, cinismo, obsessão do sexo, violência, sangue – e onde o único toque de humor? Iconoclasta ou alienado, abomina o social e o político. Daí as criaturas desumanas, os velhinhos pedófilos, museu de monstros morais, como reconhecer num deles o teu duplo e irmão?

Mestre, sim, no plágio descarado: imita sem talento o grafito do muro, a bula do remédio, o anúncio da sortista, a confissão do assassino, o bilhete do suicida. Sinistro espião de ouvido na porta e olho na fechadura. Não é o pasticho a falsa moeda desse mercador sovina de gerúndios?

Exibicionista, quer o nome sempre em evidência. Já ninguém fala ou escreve sobre seus livros – e você os suporta, um por ano, todo ano? Na fúria do ressentido, busca atingir as nossas glórias sacrossantas: Emiliano, a poesia, Turin, a escultura, Mossurunga, a música. Tudo em vão: a grotesca imagem do vampiro já desvanecida aos raios fúlgidos da História.

Pérfido amigo, usará no próximo conto a minha, a tua confidência no santuário do bar. Cafetão de escravas brancas da louca fantasia, explora a confiança de velhas, viúvas e órfãs. Ó maldito galã de bigodinho e canino de ouro, por que não desafia os poderosos do dia: o banqueiro, o bispo, o senador, o general?

“A LÍNGUA PORTUGUESA É MINHA PÁTRIA”


Uma conversa entre a Dona Etimologia, a boneca Emília e as crianças Pedrinho e Narizinho, no País da Gramática. Dá-lhe, Monteiro Lobato, bota esses gramáticos idiotas pra correr!


- E assim, se foi formando, e se vai formando a língua. Uma língua não para nunca. Evolui sempre, isto é, muda sempre. Há certos gramáticos que querem fazer a língua parar num certo ponto, e acham que é erro dizermos de modo diferente do que diziam os clássicos.

- Que vem a ser os clássicos? – perguntou a menina.

- Os entendidos chamam clássicos aos escritores antigos, como o Padre Antonio Vieira, Frei Luis de Sousa, o Padre Manuel Bernardes e outros. Para os carrancas, quem não escreve como eles está errado.
Mas isso é curteza de vistas. Esses homens foram bons escritores no seu tempo. Se aparecessem agora seriam os primeiros a mudar ou a adotar a língua de hoje, para serem entendidos. A língua variou muito e sobretudo aqui na cidade nova. Inúmeras palavras que na cidade velha querem dizer uma coisa, aqui dizem outra. BORRACHO, por exemplo, aqui quer dizer bêbedo; lá quer dizer filhote de pombo – vejam que diferença! ARREAR, aqui, é selar um animal; lá é enfeitar, adornar.

- Então lá há moças bem arreadas? – perguntou Emília.

- Sim – respondeu a velha. Uma dama bem arreada não espanta a ninguém lá do outro lado. Aqui, moço significa jovem; lá significa serviçal, criado.
Também no modo de pronunciar as palavras existem muitas variações. Aqui todos dizem PEITO; lá, todos dizem PAITO, embora escrevam a palavra da mesma maneira. Aqui se diz TENHO e lá se diz TANHO. Aqui se diz VERÃO e lá se diz V’RÃO.

- Também eles dizem por lá VATATA, VACALHAU, BACA, VESOURO – lembrou Pedrinho.

- Sim, o povo de lá troca muito o V pelo B e vice-versa.

- Nesse caso, aqui nesta cidade se fala mais direito do que na cidade velha – concluiu Narizinho.

- Por quê? Ambas têm o direito de falar como quiserem, e portanto ambas estão certas. O que sucede é que uma língua, sempre que muda de terra, começa a variar muito mais depressa do que se não tivesse mudado. Os costumes são outros, a natureza é outra – as necessidades de expressão tornam-se outras. Tudo junto força a língua que emigra a adaptar-se à sua nova pátria.
A língua desta cidade está ficando um dialeto da língua velha. Com o correr dos séculos é bem capaz de ficar tão diferente da língua velha como esta ficou diferente do latim. Vocês vão ver.

- Nós vamos ver? – exclamou Narizinho, dando uma risada. Então pensa que somos como a senhora, que vive toda a vida e mais séculos e séculos?

- Vocês também viverão séculos e séculos por meio de seus futuros filhinhos e netos e bisnetos – replicou a velha.

- Menos eu! – gritou Emília. Já me casei e me arrependi bastante. Felizmente não tive filhos – e como não pretendo casar-me de novo, não deixarei “descendência” nesse mundo...

- E se aparecer um grande pirata, como aquele Capitão Gancho, da história do Peter Pan? – cochichou Narizinho no ouvido dela.

- Isso é outro caso... – respondeu Emília, cujo sonho sempre fora ser esposa de um grande pirata – para “mandar num navio...”

Monteiro Lobato, Emília no País da Gramática, Editora Brasiliense, pgs 100, 101 e 102.

- LHUFAS - coisa com coisa nenhuma –


Henrique de Paula me manda esse texto e estreia na literatura. De pegada pop, Henrique liga seu liquidificador de textos e sai cantando um poutpourri muito louco de churrasquinhos de mães, milk-shakes de macalés, hinos e happy birthday to you. Manda ver, Henrique!


MAMA GOTHAM
sim, eu estou tão cansado mas não pra dizer que eu te lembro chinelo na mão, com nove anos, perdi minha mãe querida, o maior golpe do mundo, eu não acredito mais, parabéns pra você nessa data, querida, a data em que eu nasci em Gotham City, que eu tive na minha vida, eu estou indo embora, querida, talvez eu volte, um dia eu volto, dar o adeus da despedida, vinha vindo da escola quando de longe avistei, os mortos vivos, brava gente brasileira, no rancho que nós morava, com um abismo na porta principal, o temor servil e um céu alaranjado, minhas calças vermelhas, meu casaco de general, o avental todo sujo de ovo, cheio de anéis da mãezinha que eu amei, muitos anos de vida, muitos anos, se eu pudesse, eu queria outra vez, mamãe, queimada no fogo, a dona de tudo, a rainha do lar, triste e dolorida, parabéns pra essa data, querida, já raiou a liberdade no horizonte, vamos, vamos começar tudo, tudo de novo, o avental todo sujo, quem sabe, eu preciso esquecê-la, o chinelo na mão e as bruxas no telhado, cuidado, há uma mãe gentil no telhado, cuidado, há um morcego no horizonte do Brasil, tão cansado, tão cansado

THAT’S ALL, FOLKS!

Este último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplastro, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto. Mais: não padeci a morte da Dona Plácida, nem a semidemência do Quicas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sobra, e conseguintemente que saí quite com a vida. E imaginará mal; porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: - Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.

Palavras finais do autor-defunto ou defunto-autor Brás Cubas, em suas Memórias Póstumas.

PLEASE MISTER POSTMAN


Meu e mail: cesarcar@uninet.com.br
©Cesar Cardoso, 2010. Todos os direitos e esquerdos reservados. Que os 40 mil piolhos infectados de 18 mil camelos morféticos infestem as partes pudendas de quem publicar algum texto daqui sem avisar nem dar meu crédito.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

CAIU NA REDE É PIXEL





os botões
da blusa
que você

- LHUFAS - coisa com coisa nenhuma –

PEQUENO INDICIONÁRIO DE NUTILIDADES – FASCÍCULO 9

ALGOZAR
[De algoz + -ar. Do ár. al-guz, 'conquistador']
Verbo transitivo invasivo


1. No ato sexual, chegar ao gozo cruel que aflige até à morte o parceiro ou a parceira.
2. Atingir o orgasmo através do martírio das setas do amor divino, como teria feito Santa Teresa de Ávila. Praticar relação íntima que inclui a flagelação com setas, flechas e outros instrumentos perfurantes, com o objetivo de atingir o gozo através do ferimento.

IDIOMAR
[Do gr. idíometes, 'particularidade de estilo', pelo lat. tard. idiomare ]
Substantivo aguoso-palrativo

Oceano formado pelo desaguar dos rios Babel e Dycion, no Planalto de Léxis, na Babilônia Contada, onde nasceram as várias línguas. Ali os homens, ainda mudos, iam pescar e ficavam escutando as línguas que viviam no mar e tentavam em vão fazer com que as pedras e os peixes as aprendessem. Os homens passaram a observar as línguas e perceberam que elas entravam nas bocas dos peixes durante os primeiros dias de cada estação. Como estavam no verão, os homens esperaram a chegada do outono e então procederam a uma gigantesca matança dos peixes onde as línguas haviam se depositado, acenderam grandes fogueiras, cozinharam os peixes e os comeram durante todo o outono. E assim aprenderam a falar. As línguas, no entanto, se revoltaram com a matança dos peixes e decidiram se transformar em milhares de idiomas diferentes nas bocas humanas. Cada homem passou a ter a sua própria língua e nenhum deles se entendia. Por isso, com a chegada do inverno, os homens não conseguiam mais caçar juntos nem se proteger do frio e começaram a morrer, como os peixes. Com pena dos homens, uma pedra dágua, a única que aprendera a falar, contou-lhes o que estava acontecendo e lhes ensinou a beber da água do Oceano Idiomar durante as noites de lua azul para conseguirem se entender. Os homens assim fizeram e, dessa forma, sobreviveram e capturaram as línguas para sempre dentro de si.

LÁGRIMA DE SEIO
[Do lat. Lacrima sinu]
Substantivo consterno

Secreção lacto-aquosa, levemente alcalina, produzida pelas mães que perdem seus filhos e que não conseguem chorar pelos olhos, nem mesmo ao recolher do chão a cigarreira, que ficou inteira e boa (ele é que já não serve, jaz morto e apodrece).

NÃOPATIA
[Do gr. naunpátheia, pelo lat. nuncpathia]
Substantivo litúrgico

Simpatias impossíveis de se realizar e que curam enfermidades que ainda não existem. No passado, as nãopatias ensinaram os peixes a não se afogarem e os ovos a nascerem durante as galinhas. Através das nãopatias a morte pode conviver conosco durante algum tempo. “Com dois te vejo, com cinco te mando, com dez te amarro”, eis a chave para se conhecer e usar as nãopatias.

NÃOPLÓRIO
[Do finlandês arcaico nonploreint, por via popular]
Adjetivo não-conjecturável

O Arquipélago de Touvas, situado no Mar Juhannus Aatto, que banha a Finlândia Arcaica, foi colonizado pelos Simplórios, que estão sempre de acordo com todos e com tudo o que é dito. Como tudo que é dito é contraditório e entre todos se encontram as opiniões mais díspares, a atitude dos Simplórios causou muita discórdia e levou Touvas a viver séculos de guerras civis, como sempre cheias de assassinatos e de todo tipo de covardia. Até que no Ano Terceiro da Era Suomen Tasavalta, também conhecida como Era do Semi-Inconsciente, Touvas foi invadido pelos Ouplórios, que vieram trazer a paz. Os Ouplórios não concordam com tudo, mas querem sempre observar, descobrir e analisar o outro lado das coisas, dos fatos, dos sentimentos. Por isso eles trouxeram também a dúvida e em poucos anos ninguém em todo o reino de Touvas (os Ouplórios criaram uma monarquia em Touvas) sabia o que fazer já ao acordar pela manhã. Talvez aquilo fosse o caos, os Ouplórios ainda não estavam bem certos, mas a fome, as doenças e a miséria passaram a viver em cada casa, trazendo novas guerras civis, novos assassinatos e novas covardias. Por fim, no Ano Duzentos da Era Hanko-Nuorgam, a chamada Era do Líquido Amniótico, o país foi invadido pelos Nãoplórios. Muito objetivos e sempre desconfiados de tudo e de todos, os Nãoplórios decretaram o fim da fome, das guerras e das doenças e o início da Saimaa-Haltinturi, a chamada Nova Era. Desde então, os Nãoplórios deixaram de se comunicar com o exterior. Foram abandonadas todas as negociações de Touvas com outros países, o arquipélago retirou seus embaixadores da ONU e de todo o planeta e nem mesmo um simples telefonema de fora do país é atendido. Embora não se tenha mais notícias sobre Touvas, há boatos de que os simplórios teriam concordado com todas as novas medidas, os Ouplórios ainda estariam discutindo a respeito e os Nãoplórios teriam iniciado uma nova guerra civil.
REMEL
[Do lat. remelle]
Substantivo lacrimoso-purgativo

Remela de abelha-rainha uruçu que, ao entrar em contato com a vista humana, causa uma doença conhecida como fusco-lusco, também chamada no nordeste do Brasil de cegueira de cabaú ou mal do bangüê. O fusco-lusco é uma espécie de cegueira ao contrário, pois quem dele sofre não consegue mais fechar os olhos e enlouquece de tanto ver.

CHIPS – o prazer da batata & o poder do circuito

NOVOS HAICONTOS
DE ALICE BARREIRA


AGENDA

- Olha só, eu ia tinha uma coisa importante pra falar com você.


NIEMAYER

E então, diante da platéia extasiada, ele fez o concreto voar.


NEM TODO HOMEM É UMA ILHA

- Hoje encontrei novas pegadas. Desconfio que Sexta Feira anda me traindo.


A VISTA

Alá o gordo olhando a vista, agora uma janela vazia, uma com cortina, outra com persiana, era um gato naquela ali?, ó, alguém almoçando, ali tá em obras, uma com grade, não é bem grade, é aquele nylon trançado pra criança não se pendurar, aquilo é nylon?, uma com vidro quebrado, ih, se chover..., um ar condicionado velho, agora é grade, olha a velha, acho que me viu, não, foi só impressão, hum, ali, cheia de calcinhas secando, mais alguém olhando pra ontem, outro gordo e agora o chão onde eu me arrebento.

“NÚNCARAS” – po+es+ia -


SALGADO MARANHÃO
– UMA VOZ DA POESIA CONTEMPORÂNEA


Maranhense até no nome, Salgado Maranhão vive no Rio desde 1973. Em 78, participou da antologia Ebulição da Escrivatura e de lá pra cá vem construindo uma obra poética marcada pelo alto grau de invenção presente em sua recriação da língua no verso, buscando “a torteza inusitada que me arranque do chão”. Ali podemos encontrar suas origens, sua cor, sua vivência oriental e outros rastros da vida do poeta, mas sempre com a marca de engenho e arte para tratar de qualquer tema ou mesmo de tema nenhum.
Salgado publicou os livros Punhos da serpente (Rio de Janeiro, Achiamé, 1989); Palávora (Rio de Janeiro, Sette Letras, 1995 ); O beijo da fera (Rio de Janeiro, Sette Letras, 1996); Mural de ventos (Rio de Janeiro, José Olympio, 1998, Prêmio Jabuti), Sol Sanguíneo e A Cor da Palavra (reunião de sua obra poética até agora, Editora Imago/FBN).
O poeta também é letrista e este seu trabalho pode ser conferido no cd Amorágio, onde estão reunidas algumas de suas parcerias com Ivan Lins, Elton Medeiros, Paulinho da Viola e outros.

A cidade

Espaços da cidade
agônica
fluem com os bárbaros
insurretos. Noiados.
Sem visgo de afeto
que adoce as ranhuras .

Quito ao meu olhar
virtual
sua cota de sonhos:
gatas de chocolate
e bundas avulsas.

Que passam e não me agendam
em nenhuma manhã.

(Egos de bife e batom.)

Estrelas de carne e faíscas
entrefodem-se no Olimpo.

O azul e as farpas

Sigo a sangrar, do peito ao vão das unhas,
os dardos do amor: o que há sido e o que há.
Naufragado ao vento de um cais sem mar
o que serei se alia ao que me opunha.
As farpas do desejo – esse tear
das aranhas da dor e sua alcunha
– fazem da luz do dia uma calúnia,
cravam no azul da tarde o zen do azar.
Tento amarrar o tempo e a corda é curta,
tento medir o nada e nada ajusta.
(Meus nervos tocam para os inimigos
que chegam sob o som de uma mazurca.)
Resta a mó do destino – o desabrigo
– a devolver meu pão de volta ao trigo.

Voz

Minha carne é fibra de argila e sol
verão. Ou docas onde a dor se encuba
secretamente. Sei que em meu paiol
os andróides de porre dançam rumba.
No entanto flui de mim um girassol
lilás que luz, que jazz, que mais que alumbra,
esculpe as esquadrias do arrebol
dissolve o tempo sobre a minha juba.
Já de júbilo desse pergaminho,
aceito o temporal – redemoinho
de pedras: tanto degrau... tanta esgrima...
e ao ter somente a voz como caminho
agarro a poesia pela crina
e me arrimo na minha própria rima.

X. NADIRES

A sanha que aquece a raiz dos úmeros
enseja ao coração um disparate,
ao desvelar o que é de flor em fero,
ao se tornar fiel ao que lhe mate.
São forças que nos raptam a um sem número
de vezes e vieses e desates,
felizes perdedores desse embate;
nem no sonho que enlaça nossa íris
nessa teia de nadas e nadires
em que tudo se rende ao mesmo jogo.
Vem da palavra a sagração dos ritos:
esta relíquia de silêncio e gritos.

SENTENÇA

faz muito tempo que eu venho
nos currais deste comício,
dando mingau de farinha
pra mesma dor que me alinha
ao lamaçal do hospício.
e quem me cansa as canelas
é que me rouba a cadeira,
eu sou quem pula a traseira
e ainda paga a passagem,
eu sou um número ímpar
só pra sobrar na contagem.

por outro lado, em meu corpo,
há uma parte que insiste,
feito um caju que apodrece
mas a castanha resiste,
eu tenho os olhos na espreita
e os bolsos cheios de pedras,
eu sou quem não se conforma
com a sentença ou desfeita,
eu sou quem bagunça a norma,
eu sou quem morre e não deita.

AVISO AOS NAUFRAGANTES








NOITES DE AUTÓGRAFO DO REINALDO
O humorista Reinaldo, do Casseta & Planeta, não abandonou sua porção cartunista e acaba de lançar pela Editora Desiderata um livro genial, onde ele cria noites de autógrafos hipotéticas de mais de 60 autores de diversas épocas, estilos e lugares. Com prefácio de Sérgio Augusto (quando é que sai um livro novo dele, hein?), o livro revela Fernando Pessoa dando autógrafo para Álvaro de Campos, Ricardo Reis e Alberto Caeiro, Kafka e sua barata, Poe e seu corvo, Primo Altamirando e Tia Zulmira pedindo autógrafo pro Stanislaw Ponte Preta e até o Mandrake dos quadrinhos perdido num lançamento do Rubem Fonseca. Vale a pena.

LIÇÕES DE EROTISMO & POESIA
O poeta e professor Oswaldo Martins vai dar uma oficina de Poesia Erótica na Estação das Letras. A proposta do curso é “observar a emergência do erótico na poesia, suas manifestações e significados. Serão abordados temas como o significado do erotismo na literatura; a Priapéia greco-romana; a poesia nos jardins de Vênus; erotismo e modernidade. Análise da obra de Gregório de Mattos, Bernardo Guimarães, Verlaine, Baudelaire e Manuel Bandeira.”
O curso vai de 19 de outubro a 14 de dezembro, sempre às terças, de quatro e meia às seis e meia da tarde e custa duas prestações de 200 pratas. Eu já reservei a minha vaga. Ah, a Estação das Letras fica na Rua Marquês de Abrantes, 177, no Flamengo (Rio de Janeiro) E o telefone é (21) 3237-3947.

RIBAMAR
Esse é o título do novo livro de José Castello, lançado pela Editora Bertrand Brasil. Castello nos traz um romance onde o personagem – que também se chama José – faz uma viagem à terra natal do pai – Ribamar – buscando entender a relação que teve com ele. José também decide escrever um livro sobre essa relação, em mais uma viagem – desta vez para dentro de si mesmo. Mas afinal, o que vão construir esse personagem e esse autor homônimos? A literatura dará conta desse desencontro? Unirá os pontos que a vida deixou descosturados? Ou abrirá outros fundos de poços nesse poço sem fundo? Leia o livro, refaça as viagens de José e embarque nas suas próprias.

LITERATURA DE PRIMEIRA NA INTERNET
Grandes leituras na telinha do computador. A revista Pessoa é uma delas. Deixo eles mesmos se apresentarem: “Além de ser uma clara homenagem ao poeta maior da língua portuguesa, a revista Pessoa [...] pretende também ser um agente de intermediação entre os sujeitos da criação cultural e os sujeitos da transformação da língua. Uma revista baseada em poucos, mas sólidos princípios: promoção e incentivo à leitura, respeito à diversidade de ideias e tendências, intercâmbio entre as culturas dos povos que formam a comunidade lusófona. A revista traz textos de Marina Colasanti, Fabrício Carpinejar, do angolano João Melo e do moçambicano Luiz Carlos Patraquim, e ainda matérias sobre Saramago, Fernando Pessoa em quadrinhos e no cinema, as literaturas africanas de língua portuguesa etc. Revista Pessoa: http://www.revistapessoa.com/

A nova edição do site Germína traz entrevistas com Claudio Willer, Ruy Espinheira Filho, Santiago Nazarian e a coluna A Genética da Coisa, onde José Aloise Bahia convida mais de 30 escritores a publicar um texto e conversar sobre a criação dele com o leitor. Dentre os autores estão Silvana Guimarães, Alberto Pucheu, Ana Peluso, Rodrigo Souza Leão, Claudio Daniel e Jusssara Salazar. E tem muito mais no Germína, que está mais criativo que nunca. Germína - http://www.germinaliteratura.com.br

Outro e-mar onde vale a pena navegar é a Aliás, uma revista eletrônica de cultura, editada por Elaine Pauvolid, Anderson Luis do Vale Fonseca e Marcelo Moraes Caetano, com periodicidade trimestral. A edição atual tem contos desse autor que vos fala e de Silvana Guimarães; resenha sobre Dedo de Moça – a coletânea das Escritoras Suicidas; os poetas Luciano Garcez, Marcelo MoraesCaetano e Virna Teixeira, que lançaram seus livros este ano; e também conversa, discute e debate artes plásticas, cinema, música, etc. Caminhando entre várias linguagens, Aliás vai estabelecendo diálogos. E segue sempre com seu ótimo slogan: Aliás, goze!
Revista Aliás - http://www.aliasrevista.net/ - Aliás, revista eletrônica de cultura.

BARATA VOA - vale tudo, menos porrada –

AS SUICIDAS ESTÃO CHEGANDO,
ESTÃO CHEGANDO AS SUICIDAS...


Já está nos ares internéticos a edição 42 das Escritoras Suicidas. Desta vez os temas são masturbação, proposta e Phoenix e os textos estão ilustrados pelas belíssimas fotos de Juh Moraes. Convidadas? Adélia Prado (que também está de livro novo: A Duração do Dia), Ana Peluso, a atriz e dramaturga Neusa Doretto e a poeta portuguesa Soledade Santos. Junto com elas, o timaço de sempre das Suicidas Futebol Clube Literário (aonde joga, na ponta esquerda, minha maninha Alice Barreira – que desta vez comparece com poemas masturbatórios). Ganhe ou empate, isto é: não perca! E não esqueça o endereço: www.escritorassuicidas.com.br
Agora, só pra dar um gostinho na boca...

até que o orgasmo nos separe

para João Ubaldo Ribeiro, com paixão

O anseio surge do nada, em qualquer momento ou lugar, e umedeço como se houvesse um caudaloso rio desaguando ardente no delta entre as minhas coxas.

Quando estou em casa, não tenho pressa. Combato o bom combate de prolongar ao infinito o torpor luxuriante. Experimento o intimismo prazer de me controlar, de não permitir que as mãos cumpram o previsível ofício das carícias obvias. Sou só pele, desvario, fantasias. Imagino cenas, leio poemas, ouço Mozart, um banho morno, uma taça de vinho tinto e, já inevitável, submeto-me ao gozo.

Se estou na rua o simples ato de caminhar é suficiente para me levar ao ápice. E é como se estivesse sendo possuída por toda aquela gente que cruza de um lado para o outro com a urgência dos estúpidos.

Ocorre, às vezes, um homem, uma mulher, que percebe, que me percebe, que se aproxima, que me abraça, me dá as mãos, que caminha ao lado até que o orgasmo nos separe.

Carla Luma


bilhete

Vazia. Vazia de palavras. Uma imensidão vazia de palavras. Silêncio de palavras. Não, silêncio não. Silêncio não era feito de palavras, não continha palavras, não reconhecia palavras. Era vazia de tudo. Menos do pensamento de estar vazia.

Mas não só isso. Era mais. Era vazia do tamanho do mundo de palavras. Um mundo feito de palavras vazias de palavras. Seca de palavras. Seca.

E a solidão ruminando cheias.

Ana Peluso

OUTDOR - po+es+ia +v+is+ual


?
VOCÊ
QUE
NÃO
SEGUE
CONSEGUE
SEGUIR
QUANDO
PENSO
EM
VOCÊ
QUE
NÃO
SEGUE
?

RINHA DE GALINHA




Por Don King -
nosso correspondente na Academia Brasileira de Letras e Artes Marciais

Well, os poetas! Já foram viajantes, tuberculosos, distraídos, suicidas. De cabelo verde e blusa amarela. E já se mudaram um bocado, do exílio às torres de marfim. Só que extrair marfim agora é proibido e o aluguel de uma torrezinha qualquer está pela hora da morte. Mas junte uns vinte deles, pergunte o que é a poesia e o pau come na casa de Noca!
Holly Shit!


O que é poesia?

É saber usar a língua para extrair gemidos, uivos e palavras obscenas das mulheres mais vagabundas.
Ademir Assunção

[...] se há uma função para ela, é a de ter o poder de transformar o irreal no real e o real no imaginário. Tem o poder de humanizar um mundo que está zangado consigo. Este mundo em que vivemos em meio a tanta barbárie.
[...] Eu considero a poesia uma medicina espiritual. Posso criar com palavras o que não encontro na realidade. É uma tremenda ilusão, mas positiva: não tenho outra ferramenta com que encontrar um sentido para a minha vida ou para a vida daqueles do meu chão (vide Filhos da várzea). Tenho o poder de outorgar-lhes beleza por meio de palavras e plasmar um mundo belo expressando também sua situação. No feio também há beleza. Tudo é matéria para o poema.
Aníbal Beça

Respondendo à pergunta “o que é música?”, Schoenberg saiu-se com essa historinha:
Um cego perguntou a seu guia: - Como é o leite?
O outro: - O leite é branco.
O cego: - E o que é esse “branco”? Me dê um exemplo de algo que seja “branco”!
O guia: - Um cisne. Ele é totalmente branco e tem um pescoço longo e curvo.
O cego: - O pescoço curvo? Como é isso?
O guia, imitando a forma do pescoço do cisne com o braço, fez com que o cego o apalpasse.
O cego: “Ah, agora eu sei como é o leite”...
Augusto de Campos

Uma aventura. Um modo de expressar a imaginação. E de expressar a paixão. Uma operação sobre a linguagem. Uma experiência de liberdade, e também de possessão.
Claudio Willer

Já dei várias respostas a essa pergunta, mas acho que a melhor foi aquela que usei numa oficina que ministrei na Casa das Rosas: a poesia é uma metralhadora na mão de um palhaço. Seu poder de fogo pode ser apenas intencional, e seu efeito apenas hilário, mas o franco-atirador, ao expor-se em sua ridícula revolta, no mínimo consegue provocar alguma reação, ainda que meramente divertindo o público, e alguma reflexão sobre o papel patético dos idealistas e visionários, que, no fundo, somos todos nós.
Glauco Mattoso

Um registro da voz humana, a arte do vento.
Horácio Costa

Deve ser o substrato da primeira manhã do universo, algo que teria se fixado em minha retina nos albores de minha infância, em Sena Madureira, AC, lá pelos idos de 1935. Um cenário bucólico onde o rio, a mata, os igapés, violões à distância e o desafio dos cantadores nordestinos, soldados da borracha, tanto me deslumbravam quanto acenavam desafios que somente anos depois eu viria a aceitar, compondo o meu primeiro soneto. É um sentimento forte demais para uma criança que ainda não tinha amigos nem brinquedos.
Jorge Tufic

A poesia para mim é a forma mais eficar de alcançar algo inantigível, a essência do real ou, antes, o real em essência. É também o único modo pelo qual posso enxergar o mundo. Ela está um degrau acima da filofosia e um degrau abaixo do amor.
Micheliny Verunschk

A quinta pata do touro sírio, ou seja, a ficção que sustenta a realidade (uma segunda realidade?) ou a terceira margem de João?
Washington Benavides

(Textos retirados do livro O Que É Poesia?, organizado por Edson Cruz e lançado pelas editoras Confraria do Vento e Caliban.)

THAT’S ALL, FOLKS!



“Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai, à porta do Ateneu. Coragem para a luta.” É assim que Raul Pompéia abre seu livro O Ateneu, nome do colégio onde o personagem Sérgio vai passar dois anos de sua vida convivendo com o todo-poderoso diretor Aristarco. E vejam agora o final do romance:

“Lá estava; em roda amontoavam-se figuras torradas de geometria, aparelhos de cosmografia partidos, enormes cartas murais em tiras, queimadas, enxovalhadas, vísceras dispersas das lições de anatomia, gravuras quebradas da história santa em quadros, cronologias da história pátria, ilustrações zoológicas, preceitos morais pelo ladrilho, como ensinamentos perdidos, esferas terrestres contundidas, esferas celestes rachadas; borra, chamusco por cima de tudo: despojos negros da vida, da história, da crença tradicional, da vegetação de outro tempo, lascas de continentes calcinados, planetas exorbitados de uma astronomia morta, sóis de ouro destronados e incinerados...
Ele, como um deus caipora, triste, sobre o desastre universal de sua obra.
Aqui suspendo a crônica das saudades. Saudades verdadeiramente? Puras recordações, saudades talvez se ponderarmos que o tempo é a ocasião passageira dos fatos, mas sobretudo – o funeral para sempre das horas.
Rio de Janeiro, março de 1888.”

PLEASE MISTER POSTMAN



Meu e mail: cesarcar@uninet.com.br

©Cesar Cardoso, 2010. Todos os direitos e esquerdos reservados. Que os piolhos infectados de 18 mil camelos infestem as partes pudendas de quem publicar algum texto daqui sem avisar nem dar meu crédito.