quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

CAIU NA REDE É PIXEL




o sonho
que buda
tem

um dia
ser tão
sem

quanto
o gato
do arma
zém

CHIPS – o prazer da batata & o poder do circuito –



Meu caro maninho Cesar,

Lá vai meu segundo texto no Dedo de Moça, a antologia das Escritoras Suicidas. É mais uma Nova Carochinha. E você viu que o José Castello falou do livro na coluna semanal dele no Prosa e Verso? Pois então, roa-se todo de inveja e aprenda de uma vez por todas quem é que escreve na família. É dos caçulas que eles gostam mais... (E trata de publicar o texto dele aí no Patavina’s, viu? De preferência com a capinha do livro. Rá, rá, rá! )

Beijos incestuosos como sempre de sua maninha caçula como nunca,

Alice


CHACINA NO PALÁCIO
Irmãs da rainha Cinderela encontradas mortas
Família Real usa lei para não dar declaração
Criadagem revela detalhes do crime hediondo

Uma tragédia abalou o fidalgo cotidiano da Família Real e a tranquilidade da nação: as duas irmãs da Rainha Cinderela Augusta Caetana Gala Plotina de Bourbon e Vendôme foram encontradas mortas em seus aposentos, na ala sul do Palácio. O porta-voz da Família Real declarou que “o dolorosíssimo incidente já está sob a responsabilidade dos órgãos competentes, os Olhos e Ouvidos do Rei,” e pediu a compreensão de todos para o silêncio do Monarca e da Rainha, “extremamente abalados e tão ansiosos por esclarecimentos quanto qualquer um de nossos súditos”. Já a Rainha Cinderela lançou mão de seu direito real para não dar declarações nem poder ser interrogada e proibiu a entrada no Palácio da Polícia de Averiguação Criminal, encarregada de todos os crimes do reino.

NOTÍCIA SE ESPALHA

Apesar das determinações e cuidados tomados, a terrível notícia se espalhou rapidamente pelo reino. Segundo apurou nossa reportagem, algumas criadas do Palácio tiveram acesso ao local e juraram ter-se tratado de um crime com requintes de violência e selvageria. As irmãs Amélia Teresa e Cecília Cristina sofreram dezenas de perfurações e teriam se esvaído em sangue até a morte, lenta e dolorosa. O provável objeto que perpetrou o crime seria algum tipo de faca muito afiada, possivelmente uma adaga dupla sarracena, o que levantaria suspeitas de um atentado terrorista. Mas, ainda de acordo com algumas criadas, no meio da madrugada a madrasta da rainha Cinderela teria saído do aposento fatal, onde encontrou os cadáveres de suas filhas, chorando muito e gritando: “foi ela, ela finalmente se vingou”. Essa mesma fonte, que pediu para permanecer no anonimato, disse que a madrasta estaria acusando a enteada de ter assassinado suas filhas para se vingar do tempo em que vivia no borralho. O porta-voz da Família Real desmentiu todos esses boatos e declarou que a madrasta, atual Duquesa de Brabante e Campinas, abaladíssima com a perda foi sedada pelos médicos reais e está recolhida aos seus aposentos, orando e pedindo orações a todos os súditos. E divulgou o retrato falado de dois malfeitores que teriam conseguido penetrar na ala sul do Palácio com o intuito de roubo. Ao serem descobertos pelas irmãs, os dois meliantes teriam cometido o crime e fugido sem conseguir furtar nada, afirmou o porta-voz, garantindo ainda que os facínoras tiveram sua entrada facilitada por alguns membros da criadagem, muito provavelmente os mesmos que agora divulgam boatos infundados e mesquinhos, com o objetivo de despistar as investigações e permanecer sem serem descobertos, nas sombras de uma vida de crimes.
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UMA RELAÇÃO TUMULTUADA
O porta-voz da Família Real não se cansa de
declarar que no Palácio todos vivem felizes para
sempre, fato que pode ser comprovado nas fotos que
diariamente vemos em nossos jornais: uma família
unida e sempre risonha. Mas muitos são os que
apregoam haver disputas, intrigas e desavenças por
trás de tantos sorrisos. Boatos dão conta de que,
desde que foi aclamada Rainha, Cinderela não
permitiria a presença das irmãs nas refeições e
mesmo sua madrasta só seria autorizada a desfrutar
da mesa com a enteada sob a condição de ali
permanecer em silêncio. Há ainda a estranha história
da cirurgia plástica a que Amélia Teresa e Cecília Cristina
estariam se submetendo com o cirurgião real e que
teria sido interrompida por Cinderela, causando danos
irreversíveis aos rostos de suas irmãs. O que há
de verdade e de perfidiosa invenção nesses
boatos? Talvez nunca saibamos.
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PREPARE O SEU ORELHÃO – pras coisas que eu vou cantar...

NEGA MALUCA

Mu Chebabi canta a nossa parceria. Quem gostar pode comprar o cd “Mu Chebabi”. Lá tem Nega Maluca e mais nove criações de Mu. O cantor e compositor João Bosco gostou e disse: “O cd de Mu Chebabi não para de circular na pista do meu som. ‘Nega maluca’ me ganhou. Por ora não quero saber de outra nega. Mu é o máximo.”

OUTDOR – poemas visuais –


“NÚNCARAS” – po+es+ia


uma gagueira de vento desviou o riacho
que brisa por mim de dentro & encharcou
o fogo das duas luas de brasa do meu olhar

a sombra da ilha de um susto esti
lhaçou o ritmo do meu coração de bumbo
porcelana por ser lã

meu desejo vadio preso para averiguações
o que são viadutos & tubarões nesta cidade
de tangas tangos tarzans tragédias de tédios?

as lembranças ficam longas
você foi tão breve
que as terras que eu não inventei me sejam leves


Este texto foi publicado no livro A Nossa Moranguíssima Paixão (Editora da UERJ, 1984). O livro não se encontra mais à venda. E o autor tenta se vender mais ninguém quer comprar.

BARATA VOA - vale tudo, menos porrada –


O Pai dos Burros foi publicado como livro pela Editora Salamandra em 1996, com capa e ilustrações do grande Reinaldo, do Casseta & Planeta. Aqui ele será reproduzido em capítulos.


O PAI DOS BURROS
Guia Impraticável da Língua Portuguesa

Dedico este dicionário a Aurélio Buarque de Holanda, pelas inúmeras palavras de apoio.

Equipe de Colaboradores:

Al Capone – finanças e imposto de renda
Amir Klink – a vida sexual das focas
Cartola – futebol
Cecil B. de Mille – Bíblia Sagrada
Chico Xavier – imóveis
Deus – ciência e universo
He Man – o Esqueleto
Irmãos Marx (Grouxo, Roberto e Burle) – marxismo e revolução
Johnny Walker – enxaquecas e cefaléias
King Kong – evolução das espécies
Madre Teresa de Calcutá – Kama Sutra
Michael Jackson – pediatria e infância
Oswaldo Aranha e Assis Chateaubriand – culinária e filés


Abreviaturas, siglas e sinais obscenos usados neste dicionário:

A. – aumentativo
AM – aumentativo maior
Atc. – Atchim!
Aum. – bocejo
Bot. – Botucatu
CBF – Confederação Brasileira de Fonética
CEP – código de endereçamento pronominal
D.C. – “Desce!”
DDT – diminutivo deste tamanho
Ex. – divorciado
FDP – futuro do pretérito
H2O – Hoo
Id. – Idiota
I.e. – Ih, é!
IPI – Ipi Hurra, oba!
M – eme
Masc. – “Mas que nada, sai da minha frente que eu quero passar...”
Mô – “MÔÔ, larga esse dicionário e vem pra cama!”
Neg. “Negue o seu amor, o seu carinho, diga que você já me esqueceu...”
PI – 3,1416
Quim – Joaquim
S. – Saúde (ver atc.)
Super. – legal à beça
Tec. – barulho de tecla do computador


Prefácio de apresentação a introdução

Conheci Cesar Cardoso quando ele ensinava as primeiras letras a seu sobrinho, Fernando Henrique. Infelizmente, ele teve que parar no C, porque estava na hora de nosso ex-presidente ir pra escola. E sou testemunha de que sua vida toda tem sido uma constante luta pelo engrandecimento das letras nacionais, para que os vesgos e os míopes consigam ler sem precisar usar óculos.

Durante os anos de chumbo da ditadura militar, lá estava ele nas ruas, arriscando a própria pele para defender a garantia do emprego do hífen e das letras iniciais maiúsculas. Fui encontrá-lo, mais tarde, no exílio, mais precisamente na Universidade de Phebo, em Paris, onde era conhecido pela intelectualidade francesa como o Petit Larousse. Foi lá que ele ocupou a cadeira de Linguística, obrigando o professor a dar aula em pé.

De volta ao Brasil, em 84, foi levado a depor na Universidade da Polícia Federal do Rio de Janeiro, injustamente acusado de ligações com radiais latinos e pelo contrabando de prefixos gregos.

Afastado arbitrariamente do magistério, longe do convívio de professores e alunos, Cesar Cardoso podia finalmente pensar em ganhar dinheiro. Conseguiu uma bolsa de estudos das Semióticas do Povo, Morou? e se dedicou a escrever este O Pai dos Burros, não sem antes se alfabetizar.

Para encerrar esta breve apresentação, nunca é demais lembrar as palavras com que o próprio Cesar Cardoso, depois de concluir este livro, saudou os falantes da língua portuguesa: “vamos falar mais baixo aí que eu quero dormir, pô!”

Anuênio Gerúndio de Andrade
Presidente da Academia Brasileira de Letras de Câmbio



- E não perca no próximo capítulo as letras A, B e C deste estupefaciente dicionário.

THE PATAVINA’S NEWS

De Nova York, nosso correspondente, franco e atirador, Jean Prévert.


Meu caro Cesar,

Já fiz meu passeio matinal pelo Central Park e agora, como sempre, me sento num daquelas bancos azuis e desconfortáveis da Grand Central, para ouvir o barulho dos trens chegando e partindo. Isso virou um hábito tão forte que agora só consigo escrever daqui. Mas não me esculhambe pelas minhas idiossincasias. Podia ser pior, eu podia ficar famoso e não dar entrevistas pra ninguém.

Abracadabraço do

Jean Prévert

N. YORK – Como acontece em todo começo de fevereiro, a Sotheby’s preparou seu famoso leilão de inverno escolhendo uma de suas peças mais raras para ficar em exibição na vitrine mais cara da cidade. Dessa vez o contemplado foi Vistas de Arles, Pomar em Flor, um óleo de 72 x 92 cm, que Van Gogh terminou de pintar na primavera de 1889. O que ninguém contava é que um mascarado conseguisse burlar toda a vigilância da Sotheby’s, invadisse a vitrine, esfaqueasse o quadro duas vezes e conseguisse fugir. A polícia de Nova York ainda não tinha nenhuma pista do agressor quando a própria Sotheby’s divulgou que o quadro esfaqueado era um estudo que Van Gogh realizou e não o quadro terminado. Temendo que algo assim acontecesse, a loja expôs o estudo e ficou com o quadro original guardado a sete chaves em seus cofres. Muito bem, o agressor foi ludibriado, o Van Gogh estava a salvo e à espera de seus milhões de dólares, caso resolvido... ou quase. Acontece que o agressor veio a público. E, para surpresa geral, trata-se da artista plástica Sophie Calle. Ela divulgou um manifesto em que defende seu gesto como uma intervenção na obra de Van Gogh, resgatando-a da morte nos museus e galerias para trazê-la de volta à vida artística. A polêmica se espalhou da delegacia e dos museus para o mundo dos artistas e curadores: é arte? É crime? Um pouquinho de cada coisa? O caso continua sem desfecho mas nesse fim de semana apresentou mais uma reviravolta. O original de Van Gogh está avaliado em 18 milhões de dólares. Mas o estudo, agora com a assinatura à faca de Sophie Calle, passou a valer 25 milhões. A Sotheby’s pretende leiloar as duas peças. E instalar um detector de metais na entrada do leilão.

VARANASI, ÍNDIA – O Sanãtama Dharma Futebol Clube – time de um templo hinduísta da cidade de Varanasi– foi disputar o título da terceira divisão do campeonato do Leste da Índia, o chamado Campeonato da Baía de Bengala. (Lá há tantos times, que os campeonatos são organizados por regiões.) Eles jogavam em casa e precisavam apenas do empate para a sua conquista inédita. Mas mesmo assim perderam por um a zero. Após a partida, o time não abandonou o estádio. Reunidos no meio de campo, ali permaneceram em meditação e orações. E deu resultado: no vídeo tape mostrado à noite pelas tevês, o Sanãtama conseguiu empatar o jogo quase no último minuto e se sagrou campeão. Após o vt, a cidade toda voltou para o estádio e lá comemoraram a conquista com cânticos e rezas até o amanhecer.

MEUS CAROS AMIGOS


Aí vai minha crônica de fevereiro na revista Caros Amigos, que já está nas boas bancas do ramo e traz uma entrevista com o educador Moacir Gadotti, a polêmica sobre a caixa preta da ditadura, que a direita não quer abrir, a crise capitalista e planetária, as eleições em 2010, Evo Morales, a arte de pichadores e grafiteiros e o time de craques de sempre com Ana Miranda, Joel Rufino dos Santos, Ferréz e muito mais.


SORRIA, VOCÊ ESTÁ SENDO

15/3
Saiu o plano de reestruturação da empresa na Nova Etapa de Superação. E eles explicaram que não houve demissões e sim realocamentos de vínculos.

26/3
Recebi a avaliação da reorganização cambiante. Foi muito bom saber que atingi as metas. Há um mês que me telefonam pela manhã dizendo qual a minha tarefa do dia e em qual dos escritórios ela deve ser realizada. Isso estava me deixando muito inseguro.

13/4
Com o novo plano de carreira não sabemos mais quem são os gerentes. Alguém comentou que caberia a eles controlar o número de vezes que vamos ao banheiro. Mas logo um comunicado-adendo garantiu que o que há é uma medição higiênica inserida nos planos abrangentes de saúde. Deixei para mijar em casa.

30/4
Mudei de cidade pela terceira vez. Minha mulher decidiu se separar. Mas o setor de reengenharia familiar demonstrou que pela alínea b da cláusula 5 do contrato de troca de serviços ela é obrigada a me acompanhar. Não posso negar que fiquei feliz. Até porque eles já haviam negado o visto de co-moradia para meu filho, que teve que ir morar com os avós.

16/5
Tenho bebido muito ao chegar em casa. Foi o que eles disseram.

24/5
Contei ao psiquiatra indicado pelo departamento de felicidade que estou abandonando o emprego, que estou abandonando tudo. Isso mesmo, vou me matar.

25/5
Estive com o psiquiatra ontem à noite e hoje bem cedo recebi um comunicado-adendo avisando que pelas regras flexibilizadas de relacionamento pessoal não estou autorizado a me suicidar e toda a minha família pagará pesadas multas por muitos anos se isso vier a acontecer. Fiquei impressionado com a velocidade com que eles me responderam. Mas o dinamismo era um dos principais pontos do plano de reestruturação da empresa na Nova Etapa de Superação, não era?

- LHUFAS - coisa com coisa nenhuma –


TIA ANASTÁCIA PROCESSA DONA BENTA

Os advogados de Anastácia Dória, 78, conhecida como Tia Nastácia, entraram ontem com processo na 13ª Vara de Trabalho de Taubaté contra dona Benta Encerrabodes de Oliveira. Anastácia alega ter trabalhado para Dona Benta por 45 anos no Sítio do Picapau Amarelo, exercendo as funções de empregada doméstica, babá, governanta e agricultora, sem receber nenhum salário. E há três anos teria sido despedida e despejada de sua moradia, um barraco nos fundos da casa da fazenda, sem nenhuma indenização. Já os advogados de dona Benta afirmaram em juízo que Anastácia e Benta eram simples amigas e moravam juntas no sítio, nunca tendo havido nenhum vínculo empregatício entre elas. Segundo eles, Benta e Anastácia faziam várias atividades juntas e em comum acordo, como cozinhar, lavar, passar, varrer, cuidar da horta e das crianças. Os sobrinhos de dona Benta, Pedro Encerrabodes de Oliveira e Lucia Encerrabodes Cambará, conhecida como Narizinho, confirmaram em juízo as declarações da tia. E embora não tenha sido levado em consideração pelo juiz, causou frisson no tribunal o depoimento do travesti conhecido como Boneca Emília, que afirmou que Nastácia e Benta eram mais do que amigas, eram amigadas.

Um item apresentado como prova de trabalho pela acusação - o “Livro de Receitas de Dona Benta”- acabou sendo motivo de grande tumulto no tribunal pois nesse momento “Tia Nastácia” levantou-se e, bastante nervosa, acusou dona Benta de ter roubado dela todas as receitas publicadas na obra. O julgamento teve que ser interrompido até que a Anastácia fosse acalmada por seus advogados. Aguarda-se para amanhã o depoimento-chave do escritor Monteiro Lobato.

AVISO AOS NAUFRAGANTES

CARNAVAL 30 HORAS

São três dias de folia e brincadeira. E isso é o que me revolta. Por quê? Por que três dias ou setenta e duas horas ou quatro mil novecentos e vinte minutos ou duzentos e noventa e cinco mil e duzentos segundos, por quê? Por que a vida não pode ser um eterno carnaval? Isso mesmo, um carnaval que não acabasse nunca, que só acabasse com a morte, que seria chorada pelos que ficam em outro grande carnaval?

Não me julguem mal nem me tomem por quem não sou, anarquista, subversivo dos costumes, ou mesmo terrorista, que é o termo da moda, substituto dos velhos comunistas comedores de criancinhas. Nada disso, o que pretendo com o carnaval é até uma espécie de globalização. Sim, sei que a festa já é planetária, mas, como eu falei, são três dias, apenas três dias num mundo em que tempo é o quê? Exatamente isso que você pensou: dinheiro!

E o carnaval, o que é? Para brincar o carnaval, milhares de pessoas fazem fantasias, desfilam em blocos e escolas de samba, consomem milhões de litros de cerveja. refrigerantes e cachaça, atiram para o ar quilômetros e quilômetros de serpentinas e bilhões de rodelinhas de confetes coloridos, sem falar em camisinhas, salgadinhos, chocalhos, energia elétrica, comprimidos para ressaca, transportes variados até os locais de folia, cds com samba-enredo, band-aids para pés machucados, etc, etc, etc. E do que essas pessoas precisam para consumir tudo isso? O que é que possibilita a elas o acesso a esses bens, materiais ou não? Exatamente isso que você pensou de novo: dinheiro!!

Chegamos assim à conclusão de que tempo é dinheiro e carnaval também é dinheiro. Mas isso não basta. É preciso lembrar o que o carnaval é, antes de qualquer outra coisa: o carnaval é alegria. Essa é sua essência, sua alma, sua vida. E agora raciocine comigo. Se o tempo é dinheiro, se o carnaval também é dinheiro e o carnaval é antes de tudo alegria, chegamos à óbvia conclusão que a alegria é o quê? Exatamente isso que você pensou mais um vez: dinheiro!!!

Ora, ora, se a alegria é dinheiro, por que termos um carnaval que dura só três dias? É um desperdício. Temos que ter carnaval todos os dias, todas as horas, todos os minutos e segundos. Escola de samba, trio elétrico, bloco, baile, micareta, batucada, correria, o diabo a quatro!

E não basta! Sabem por quê? Você tem que juntar uma porção de gente pra fazer uma batucada, duas porções de gente pra um bloco, três pra uma micareta e por aí adiante em progressão geométrica. É gente que não acaba mais. E juntar gente é sempre confuso. Um não vem porque brigou com o patrão, outro tem medo de multidão, um passa a mão na bunda da mulher do outro e já sai briga... É difícil. Não que eu seja contra a folia coletiva. Ela pode continuar acontecendo com suas datas. A revolução que precisamos fazer é outra.

Precisamos individualizar o carnaval. Tudo na nossa sociedade é individual. Cada um vive pra si e o outro que se dane, a base de nossa civilização contemporânea é o egoísmo. Então por que não estendemos ao carnaval esses valores que construímos tão arduamente com sangue, suor e lágrimas alheios?

Vamos criar o carnaval on line, onde cada um vai poder brincar em casa, no sossego do seu quarto, diante de seu computador. E todo mundo vai poder passar a mão na bunda de todo mundo, sem briga. É virtual. E até por isso mesmo quem quiser brigar também pode. E mais: teremos o carnaval via celular. É só você deixar seu aparelho ligado o tempo todo que, a qualquer momento do dia ou da noite, nossa central carnavalesca vai lhe enviar uma mensagem, um torpedo, chamando você para brincar, pular, cair na farra.

Seremos todos foliões de tempo integral, sem nenhuma possibilidade de tristeza e com um sentimento único: quanto riso ó quanta alegria, quanto riso ó quanta alegria, quanto riso ó quanta alegria, quanto riso ó...

PLEASE MISTER POSTMAN

Foto de Walter Firmo.

©Cesar Cardoso, 2010. Todos os direitos e esquerdos reservados. Que os piolhos infectados de 18 mil camelos infestem as partes pudendas de quem publicar algum texto daqui sem avisar nem dar meu crédito.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

CAIU NA REDE É PIXEL


Bahia de Todos os Santos

Cabo das Tormentas


Ártico

dois de fevereiro
dia de amar os mares e suas rainhas
as marés e suas mulheres
as marias e suas marinhas

- LHUFAS - coisa com coisa nenhuma –


PEQUENO INDICIONÁRIO DE NUTILIDADES – CAPÍTULO 6

Bem-te-verme
[do latim bene-tuu-vermis]
S.m. Bras. Ínfima Zoologia.
Ave parasita, de asas e cauda manchadas de vermelho vivo, cabeça amarela, garganta azul, peito e abdômen roxos। Descoberto pela nanobiologia, o bem-te-verme é considerado a mais bela ave do reino animal. Mas seu tamanho é tão reduzido que ele só pode ser visto em microscópios. A bem-te-verme-mãe esconde seus filhotes recém-nascidos dentro da banana-de-cauda-roxa, que é devorada pelos babuínos do arquipélago africano Frijol de Carita. Assim, o bem-te-verme passa toda a sua vida dentro do estômago deste símio, só saindo para se reproduzir e morrer. Mas, por ser tão mínimo, mesmo ali ele pode executar belos vôos helicoidais.


Cedoso
[Do lat. ceatosu, pelo grego arcaico
αλφάβητου]
Adjetivo poroso.

Suavidade prematura da primeira claridade da manhã, formada por fios de luz esverdeada, emanados pela estrela Urucuia, da constelação de Diadorim. Ela brilha no hemisfério sul apenas na madrugada de 19 de março, dia de São José, marcando o início da estação das chuvas no nordeste brasileiro. Em seu livro “Vida Social No Brasil em Meados do Século XIX” Gilberto Freyre registra que “os devotos de São José seguiam os tênues fios verdes do cedoso, para encontrar as pedras de sal, garantia de um ano com muitas chuvas”.

Frijol de Carita
Ilha do Caribe, onde escravos de diversos países se refugiaram durante o século 17. Tropas espanholas atacaram a ilha várias vezes sendo sempre rechaçadas. Por fim, uma grande frota foi montada para um ataque final. E aquela que ficou conhecida como A Armada Invencível realmente não foi derrotada. Mas também não venceu porque simplesmente não conseguiu encontrar a ilha, por mais que passasse meses esquadrinhando o Mar do Caribe. Alguns babalorixás caribenhos contam que os negros arrancaram a ilha do fundo do mar e remaram com ela de volta até a África. Ela seria o arquipélago que forma Cabo Verde e tem o formato de uma fava de feijão fradinho, sua principal plantação.

Nonadeira

[Da loc. do lat. tard. res non nata, 'nenhuma coisa nascida', com perda do res + sufixo eira ]
Substantivo nódino.

Árvore do conhecimento do bem e do mal, cujo fruto é a nonada. Ela também foi expulsa do paraíso por Deus e replantada por dois anjos às margens do Rio Hades, nas portas do inferno, onde é protegida pelos cães de agosto. Tem a casca pelo lado de dentro e seus gomos estão sempre expostos. Ao serem bicados pelos pássaros eles sangram.

Pedra do Sono
[Do ár. al-pelderal sonkayl ]
Locução substantiva inorgânica

Mineral que faz a pessoa dormir por sete anos. Para que funcione, na primeira lua minguante de um ano bissexto, a pessoa deve se banhar, sem saber, com a água em que três pedras do sono estiveram mergulhadas por três semanas. Depois de trabalhar durante 21 anos para Labão, Jacó descobre a pedra do sono e prepara dois banhos, um para seu patrão e outro para sua filha Lia, com quem Jacó teve que se casar. Em seguida, Jacó foge com sua amada Raquel, a serrana bela, dizendo a ela: - Temos sete anos de felicidade até que eles acordem e venham nos procurar.

Pernunca
[Do latim Pernnuncale]
Subst. cláudico

A perna que o saci não tem. Quando o saci nasce é uma criança comum. Na madrugada em que a estrela Urucuia brilha nos céus, a mãe dessa criança faz um pacto com o demônio, indo até um pé de quilelenga-verde e trocando essa perna pelo barrete vermelho que dará poderes a seu filho. A pernunca vive vagando pelas densas matas amazônicas mas raramente encontra seu dono, que tem como maldição passar a vida toda fugindo dessa perna. Quando uma pernunca encontra seu saci, o demônio vem para tomar-lhe o barrete e levá-lo para o inferno.

Pintadinho do céu
Do armênio hɑjɛɹɛnɑ lɛzu h ɹɛnuzlɛjɛ
Locução diminutiva alada
Ave que vive nos céus pintados no teto da igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto। Há quem diga que ela é apenas uma pintura criada por Mestre Ataíde em finais do século 18. Mas, segundo fontes descobertas por Câmara Cascudo, o pintadinho do céu se finge de pintura e ali permanece imóvel, se alimentando apenas da música do famoso órgão desta igreja. E quando, durante um batizado, o pintadinho do céu canta, é sinal de que aquela criança será um lobisomem.


São Reimok
No século 10, o reino de Monngüber, na Vissônia Setentrional, era governado por Reimok Segundo। Quando a rainha engravidou pela primeira vez, Reimok se converteu ao catolicismo e prometeu que, se Deus lhe desse um filho varão, ele invadiria todos os reinos vizinhos e os converteria à sua nova fé, mesmo que fosse a ferro e fogo. Mas Deus lhe deu uma filha. E depois outra. E mais outra. E por mais que Reimok fizesse mais e mais promessas e até invadisse todos os reinos vizinhos – e até alguns mais distantes – e os transformasse a ferro e fogo em leais seguidores de Cristo, e cortasse as cabeças e as línguas e amputasse as mãos e os pés e furasse os olhos de todos os que recusassem a palavra do Senhor, mesmo assim Deus insistia em lhe dar filhas. A rainha estava grávida pela sétima vez e, já em desespero, Reimok foi consultar as feiticeiras que ele mesmo havia banido do reino. E elas previram a vinda de mais uma fêmea. Reimok mandou matar a rainha, que ele amava, e enterrou-a no meio da imensa floresta que cercava Monngüber e fornecia caça e frutos e lenha para o reino. Nos seis meses seguintes um gigantesco incêndio queimou toda a floresta, transformando-a num deserto sem vida. Reimok saiu de seu castelo e, de joelhos, atravessou o deserto ainda cheio de restos de árvores em brasa. As chagas se abriam por suas pernas em carne viva. E por sete dias e sete noites despencaram dos céus sete tempestades que destruíram todo o reino. Quando finalmente as águas baixaram, retornaram os poucos súditos que conseguiram sobreviver. E, assombrados, viram surgir uma igreja toda feita de conchas e corais, bem no centro da antiga floresta. Lá dentro estavam Reimok e toda sua família. Os súditos entraram na igreja e puseram-se a rezar. E depois de sete dias e sete noites de reza, viram entrar no templo a rainha. E ela trazia nos braços uma criança, que Reimok não chegou a ver. Ele abdicou do trono em favor dela e partiu para o deserto, vivendo como monge anacoreta até morrer em 987. Oitenta anos depois foi canonizado.


Soninquê
[Do macedônio So
акедонскиикi]
Reverbo impessoal

Tipo de sono em que a pessoa pensa que está dormindo e sonhando mas tudo o que acontece é real. É causado pela Pedra do Sono.

Ut
[Do germânico üüß]
Nome da oitava nota musical, a única que não pode ser escutada pelo ouvido humano. É emitida pelas baleias beluga e por alguns insetos das florestas do sudeste asiático. Foi descoberta e grafada na sexta linha da pauta pelo monge beneditino Guido d’Arezzo, em 1032, na Toscana. O compositor Mozart foi o único ser humano até hoje a compor uma sinfonia na clave de Ut. Ele pretendia tocá-la no Mar do Norte, na época do acasalamento das belugas, mas morreu antes de realizar tal proeza.

Vila De Ávila
Cidade do Vale do Jequitissonha mineiro, que forma com suas vizinhas Barroquinha do Oeste, Lúdico e Catas de Aluvião o Quadrilátero Onírico. Chega-se à Vila de Ávila após o terceiro sonho com a cidade. Mas deve se retornar de lá antes da estação das chuvas pressentidas, que molham antes de desabar, ou a pessoa nunca mais será capaz de encontrar o caminho de volta.

CHIPS – o prazer da batata & o poder do circuito –


DEDO DE MOÇA & ALICE BARREIRA

Meu caro maninho Cesar,

Aí vai mais uma carochinha. Essa é uma das duas que saíram na coletânea das Escritoras Suicidas, Dedo de Moça. Te mandei o livro mas você não me disse se recebeu, seu mal educado. E você, continua escrevendo? Isso mesmo: insista bastante que um dia você aprende.

Beijos em tua bela boca.

Da sua irmã, cada vez mais caçula e incestuosa,

Alice


PROVANDO DO FEITIÇO

O príncipe avisou-lhe que ia ficar longos meses fora em mais uma guerra, mas que seria o mais cruel dos homens em cada batalha, para assim poder voltar logo aos braços de sua esposa e amada; e nas batalhas, enquanto torturasse e matasse seus inimigos, não pensaria em outra coisa a não ser nela. Beijou a testa da princesa e se foi. Ela se deixou ficar na janela real, vendo o príncipe e a tropa desaparecerem na curva da estrada real. Tudo ali era tão real... E ela chorou como nunca chorara, nem nos tempos de maldições, perseguições e bruxarias, nem nos piores pesadelos que tivera nos cem anos de sono.

Houve então um passe de mágica, coisa que ela não via há anos. E a outra surgiu bem à sua frente. Perguntou quem era a aparição e ao saber que se tratava de sua fada madrinha, questionou logo: por que você me deixou dormir cem anos? A outra explicou então que era apenas uma de suas fadas madrinhas, não tinha tantos poderes assim, muito menos para enfrentar a bruxa que a enfeitiçara, fazendo-a dormir aquele tempo todo. Mas também tinha valor, afinal fora ao seu batizado e lhe dera de presente nada mais nada menos do que a beleza, atributo que ela ainda carrega no nome e no corpo, e que encantara o príncipe. Ao ouvir falar do príncipe, Bela suspirou e balançou a cabeça. A fada logo interpretou o gesto como saudades, prontificou-se a usar seus poderes para resolver o problema e antes que Bela dissesse ah, brandiu sua varinha de condão e se metamorfoseou no príncipe, mais encantado do que nunca. A fada-agora-príncipe ia começar uma possível declaração de amor, mas Bela interrompeu-a. Não suspirara por saudades do príncipe, a vida do casal já estava longe de ser uma maravilha, ele só pensava em guerras, invasões, batalhas e o mais das vezes chegava exausto na cama, pegando no sono rapidamente. Pelo menos não roncava, como Bela ouvia falar da maioria dos homens, mas deveria sonhar muito mais com os inimigos do que com sua princesa.

Diante dessa triste história, a fada voltou à sua forma original e as duas sentaram-se na varanda do quarto, que dava para o bosque real. E então foi a vez da fada desabafar. Sua vida também não era tão graciosa quanto parecia nas histórias. Fadas passam os dias e as noites fazendo mágicas, quase sempre as mesmas. Arranjam muitos príncipes, mas nunca ficam com nenhum deles, sempre morrem solteiras. E lembrou quantas vezes desejara para si um daqueles homens que entregara para tantas donzelas. Certa vez, não se conteve e ficou invisível para espiar um deles nu, no banho. E qual não foi seu susto ao ver o tal príncipe se masturbar no banheiro. Chegou a dar um grito, que fez o outro interromper o que fazia, olhar em volta desconfiado e se certificar de que a porta do banheiro real estava mesmo trancada.

As duas riram um pouco e Bela contou sua única aventura. Foram — ela e seu príncipe — visitar um reino vizinho. Lá mandava um imperador. O homem achava o título mais imponente do que príncipe ou mesmo rei. Era muito vaidoso, como a maioria dos reis, príncipes ou lá que nome tivessem ou se atribuíssem. E embora ficasse se pavoneando bastante, era de fato inteligente e bonito e Bela passou a noite entretida com seu charme. Na hora dos licores e charutos, seu marido foi escolher o que iria fumar e ela ficou a sós com o imperador por um brevíssimo instante. Muito breve mesmo, mas suficiente para que o homem a agarrasse pela cintura, a puxasse para si e lhe tascasse um beijo na boca. Bela conseguiu se soltar, deu um tapa no rosto do abusado, e foi ao encontro do marido no salão ao lado. E até o final da visita, ela e o conquistador barato agiram como se nada houvesse acontecido. Bela nunca tocou nesse assunto com o marido nem com ninguém. Nem contou — como fazia agora — que não botou muito empenho no tapa e até demorou um pouco para começar a fazer força e se soltar. Ainda era capaz de sentir os lábios do outro nos seus.

Nesse instante a fada dá um pulo do sofá e, enquanto grita "tenho uma ideia!", corre até o quarto, pega sua varinha e — mágica das mágicas, tudo é mágica! — se transforma no imperador vaidoso. Bela olha o outro sem saber o que fazer. Então, lentamente, se aproxima e beija aqueles lábios, agora sem tapa nem interrupção.

E elas não foram felizes para sempre, mas tiveram muitos momentos divertidos naqueles dias.

HOJE É DIA DE VISITA


O poeta e jornalista Claufe Rodrigues nos visita e traz uma conversa poético-paródica com Manuel Bandeira. Com certeza o poeta do Castelo lerá e rirá com todos os seus dentes de piano.
Quer mais poemas do Claufe? É só ir em
www.clauferodrigues.com। Uma boa dica também é o último trabalho em livro de Claufe: O Poeta Fingidor (Editora Globo): uma antologia de Fernando Pessoa, com iconografia que além de fotos traz desenhos e manuscritos, um DVD com documentário que Claufe fez sobre o poeta e foi exibido pela Globo News e prefácio de Carlos Felipe Moisés.

VOU-ME EMBORA PARA CASA
um poema-paródia para Manuel Bandeira

Vou-me embora para casa
lá sou inimigo do rei
lá tenho a mulher que eu quero
na cama que ainda não sei
Vou-me embora para casa
aqui eu não sou feliz
lá a existência é uma aventura
de tal modo inconseqüente
que Joana, a louca de Espanha,
não cala nem consente.
E voltarei a fazer ginástica
andarei de bicicleta na Lagoa
soltarei pipa no alto do morro
tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
do barulho e dos vizinhos
boto um Dylan no ouvido um Cartola na vitrola
pra me contarem as histórias
que no tempo de eu menino
só eles sabiam contar

Vou-me embora para casa
lá tem de um-tudo
é outra civilização
tem um processo seguro
de transar sem camisinha
tem computador, microondas, celular,
tem viagra e tem prosac (se um dia eu precisar),
tem prostitutas na pista
pro pitboy espancar.
E quando eu estiver mais triste
triste de não ter jeito
quando à noite sentir ganas de matar alguém
- lá sou inimigo do rei –
terei a mulher que quero
na cama que ainda não sei
Vou-me embora para casa.

HOJE É DIA DE VISITA - 2


A PAIXÃO SEGUNDO A.B.

Essa mulher sabe que por ela / sou capaz de tudo / sou capaz até / de atravessar a Rua dos Gusmões / lendo Ali Babá e os Quarenta Ladrões /

Hoje vivo no abandono / um vira-lata sem dono / e pra me judiar, Pafunça / nem meu nome tu pronunça /

Doutor, eu vou lhe ser franco / por essa nega eu já vi muito branco / subir parede lisa de tamanco /

Com a corda mi do meu cavaquinho / fiz uma aliança pra ela / prova de carinho /

De lembrança guardo somente suas meias e seu sapato / Iracema, eu perdi o seu retrato /

E no chão, bem perto do fogão / encontrei um papel escrito assim / pode apagar o fogo, Mané, / que eu não volto mais /

Teu olhar mata mais do que bala de carabina / que veneno estricnina / que peixeira de baiano / teu olhar mata mais do que atropelamento de automóver / mata mais que bala de revólver /

Pode ficar com tudo que te dei / pode ficar até com meu colchão / eu voltei somente pra pegar / meu cachorrinho, meu cobertor e meu violão /

Sem ela eu não posso ficar / sem meu violão /o que é que eu vou fazer / a malvada quer / que eu troque o samba / pelo iê-iê-iê /

Eu sou a lâmpida / e as mulher é as mariposa / que fica dando vorta em vorta de mim /toda noite só pra se esquentar /

Um dia Deus pegou Adão, tirou uma costela e fez a mulher. Desde então o homem trabalha pra ela. Vai daí o homem reza todo dia uma oração: “se quiser tirar de mim alguma coisa de bom, que me tire o trabalho, a mulher não!”

MEUS CAROS AMIGOS

Aí vai a minha crônica na revista Caros Amigos do mês de janeiro, que já se encontra nas boas bancas do ramo. No número desse mês, Irmã Geraldinha: mais uma freira na mira do latifúndio; o Partido Pirata – contra as patentes do capitalismo; entrevista com Letícia Sabatella. E o time de craques de sempre, como Emir Sader, Frei Betto, Joel Rufino dos Santos e muito mais.

UM HERÓI


Lutei o bom combate. E ele era tão bom e justo e nobre, que eu seguia lutando mesmo com a chegada da noite, dos ventos, das tempestades. E, em meio às trevas, só reconheci meu próprio irmão quando o trespassei com a espada, julgando ser um inimigo.

Aquilo caiu sobre mim como uma maldição. Eu derramara o sangue do meu sangue! Mas o bom combate precisava de mim. E voltei a lutá-lo. E dessa vez matei meu pai. Para melhor lutar o bom combate, ele se disfarçara de árvore. Como era uma árvore que não crescia em nossa floresta, tomei-a por uma vegetação inimiga e trespassei-a com a espada. Quando a árvore me disse: “filho, o que fizeste?”, tive consciência de minha nova tragédia.

Sem poder encarar os companheiros e a família, parti. Mas nem o coração dilacerado me impediu de seguir lutando o bom combate. Disfarçado, invadi o território inimigo aleijando, trucidando e matando. Mapeei, uma por uma, as nascentes de água que abasteciam sua capital. E numa só noite, mesmo com a chegada dos ventos e das tempestades, envenenei toda a água. De madrugada escutei os gritos dos que morriam. E ao amanhecer entrei, triunfante, na cidade dominada. Corpos e mais corpos jaziam nas ruas. E pude reconhecer ali minha mãe, minhas irmãs, meus filhos e meus vizinhos. Todos mortos, envenenados. Eu não sabia que nós havíamos ganhado a guerra e invadido a cidade uma semana antes.

Me deixei ficar para ser capturado pelo inimigo que voltava. Eles me pegaram, me carregaram pelas ruas cheias de sangue enquanto davam vivas ao seu salvador. Agora sou o maior herói da História. Pelo menos da História que eles repetem diariamente em seus livros escolares.

(O autor desse texto foi dispensado de lutar o bom combate por ter pé chato.)

“NÚNCARAS” – po+es+ia


corpo
a
corpo

no
corpo

corpo

no
meu
corpo
nu

o
teu
corpo
nu

no
meu
corpo
nuvem

o
teu
corpo
nunca

AVISO AOS NAUFRAGANTES

VOCÊ JÁ PROVOU DEDO DE MOÇA?



Pra quem quiser conhecer um pouco mais da coletânea que reúne as Escritoras Suicidas, é só visitar a revista de poesia ZUNAI (http://www.revistazunai.com/). Abaixo, está o menu que você vai encontrar lá. (Pode ir direto daqui, mas vale a pena dar um rolé pela ZUNAI.)

Chacina no palácio, de Alice Barreira
O miúdo e o largo, de Eugênia Fernandes
Olho de peixe, de Julya Vasconcelos
Há um abismo nos cantos do mundo, de Lucélia Majistral
Tentativa, de Ro Druhens
Língua de reis, Verônica Couto

HOJE É DIA DE VISITA – 3

MANOEL DE BARROS


Seis ou Treze Coisas que Aprendi Sozinho
de "O Guardador de Águas", Ed. Civilização Brasileira.
1
Gravata de urubu não tem cor.
Fincando na sombra um prego ermo, ele nasce.
Luar em cima de casa exorta cachorro.
Em perna de mosca salobra as águas se cristalizam.
Besouros não ocupam asas para andar sobre fezes.
Poeta é um ente que lambe as palavras e depois se alucina.
No osso da fala dos loucos têm lírios.
3
Tem 4 teorias de árvore que eu conheço.
Primeira: que arbusto de monturo agüenta mais formiga.
Segunda: que uma planta de borra produz frutos ardentes.
Terceira: nas plantas que vingam por rachaduras lavra um poder mais lúbrico de
antros.
Quarta: que há nas árvores avulsas uma assimilação maior de horizontes.
7
Uma chuva é íntima
Se o homem a vê de uma parede umedecida de moscas;
Se aparecem besouros nas folhagens;
Se as lagartixas se fixam nos espelhos;
Se as cigarras se perdem de amor pelas árvores;
E o escuro se umedeça em nosso corpo.
9
Em passar sua vagínula sobre as pobres coisas do chão, a
lesma deixa risquinhos líquidos...
A lesma influi muito em meu desejo de gosmar sobre as
palavras
Neste coito com letras!
Na áspera secura de uma pedra a lesma esfrega-se
Na avidez de deserto que é a vida de uma pedra a lesma
escorre. . .
Ela fode a pedra.
Ela precisa desse deserto para viver.
11
Que a palavra parede não seja símbolo
de obstáculos à liberdade
nem de desejos reprimidos
nem de proibições na infância,
etc. (essas coisas que acham os
reveladores de arcanos mentais)
Não.
Parede que me seduz é de tijolo, adobe
preposto ao abdomen de uma casa.
Eu tenho um gosto rasteiro de
ir por reentrâncias
baixar em rachaduras de paredes
por frinchas, por gretas - com lascívia de hera.
Sobre o tijolo ser um lábio cego.
Tal um verme que iluminasse.
12
Seu França não presta pra nada -
Só pra tocar violão.
De beber água no chapéu as formigas já sabem quem ele é.
Não presta pra nada.
Mesmo que dizer:
- Povo que gosta de resto de sopa é mosca.
Disse que precisa de não ser ninguém toda vida.
De ser o nada desenvolvido.
E disse que o artista tem origem nesse ato suicida.
13
Lugar em que há decadência.
Em que as casas começam a morrer e são habitadas por
morcegos.
Em que os capins lhes entram, aos homens, casas portas
a dentro.
Em que os capins lhes subam pernas acima, seres a
dentro.
Luares encontrarão só pedras mendigos cachorros.
Terrenos sitiados pelo abandono, apropriados à indigência.
Onde os homens terão a força da indigência.
E as ruínas darão frutos

Além de visitar o PATAVINA’S, o poeta Manoel de Barros também está nas telas de cinema, no documentário de Pedro Cezar “Só 10% é Mentira”. Vale a pena conferir o filme, que também assume uma linguagem poética para mostrar a poesia desse autor tão singular e plural. E o humor do poeta é uma delícia.

PATAVINinha’s

- o playground do patavina’s –
Enquanto o papai acessa o site pornô, as criança lê poesia!


A SERPENTE CONFUSA

A serpente Sarará
todo sábado de manhã
escova os dentes no banheiro
bebe um suco de maçã
põe dinheiro na carteira
pega a bolsa e vai à feira.

Mas hoje perdeu a hora
e fez tudo ao contrário.
Guardou a maçã no armário
escovou-se com a carteira.
Pôs a bolsa no banheiro
fez um suco de dinheiro.
Foi-se deitar bem ligeira
dizendo: “preciso ir à feira”.


PLEASE MISTER POSTMAN

(Foto de Walter Firmo.)


MEU E MAIL

cesarcar@uninet.com.br

©Cesar Cardoso, 2009। Todos os direitos reservados। E os esquerdos também. Que as pulgas infectadas de 6000 camelos sarnentos infestem a cama de quem publicar algum texto daqui sem avisar nem dar meu crédito.