domingo, 2 de abril de 2017

OS URUBUS EM CÍRCULOS CADA VEZ MAIS PRÓXIMOS


Esse é o título de meu novo livro de contos, que vou lançar pela Editora Oito e Meio, no dia 18 de abril. Já, já mando mais informações sobre o lançamento. Enquanto isso, vai a seguir um dos contos. 

A PRISÃO 2 – O VEREDITO

Há três anos saíra o veredito: condenada à morte na forca. A sentença se cumpriria em três semanas. No dia da execução, foi acordada na hora marcada, um pouco mais cedo do que de costume. O café já estava na mesa e tudo funcionava com perfeição, como sempre. Foi levada para o local da execução e, no caminho, começou a receber todas as informações referentes ao enforcamento. Quantas pessoas já haviam sido enforcadas ali, que tipo de crime a maior parte delas cometera, quanto tempo o cérebro ainda vive após o corpo despencar, que reações físicas e químicas o organismo detona antes, durante e até mesmo após a queda. Finalmente chegou ao cadafalso e foi preparada para o último gesto, ainda com mais informações: de que material é feita a corda, qual o tipo de madeira usada no patíbulo, quantos carrascos já passaram por ali. Foi até mesmo apresentada ao seu próprio carrasco, embora já estivesse vendada e com a corda no pescoço. O homem puxou conversa, trocaram algumas frases. Por fim seguiu-se um profundo silêncio e ouviu-se o ruído metálico de uma alavanca sendo acionada. E tudo se apagou.
Acordou na enfermaria, onde lhe informaram que houvera um problema técnico com a alavanca e sua execução falhara. Ela desmaiara com certeza por toda a tensão envolvida. Com um pedido de desculpas do diretor do presídio em pessoa, foi reconduzida à sua cela e informada que o procedimento seria refeito na manhã seguinte.
E realmente na manhã seguinte, ela foi novamente acordada um pouco mais cedo do que de costume e mais uma vez passou por todo o ritual, com novas informações e novos dados sobre todo o processo. Até a alavanca ser novamente acionada.
Mais uma vez acordou na enfermaria e foi-lhe explicado o novo defeito, desta vez na polia que movimenta a corda. Mais uma vez o diretor se desculpou pessoalmente e ela retornou à cela.
Passaram-se cinco meses de execuções diárias e mal-sucedidas. Ela já conhecia de cor todo o funcionamento da forca, já cumprimentava o carrasco pelo primeiro nome e perguntava pela mulher e pelos filhos dele. A única surpresa eram os infindáveis defeitos, sempre um diferente do outro, chacoalhando dentro de sua cabeça.
Até que ontem, pela primeira vez, os guardas se distraíram e a levaram de volta à cela sem retirar o cinto que lhe segurava a roupa de execução. E assim que trancaram a porta, ela se enforcou nas grades. 


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